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Está na hora de comprar um smartwatch? LEIA!

NO MERCADO Os novos G Watch, da LG; Moto 360, da Motorola; e Gear Live, da Samsung. Todos usam o sistema do Google (Fotos: divulgação)

É extensa a lista de eletrônicos que entraram em nossa vida nos últimos 15 anos. O iPod, lançado em 2001, popularizou a música digital. Em 2007, o iPhone foi anunciado como a revolução da telefonia – e cumpriu a promessa. No mesmo ano, a Amazon lançou o leitor de livros eletrônicos Kindle. Finalmente, quando os anos 2000 já estavam no fim, a Apple anunciou o tablet iPad. Ele fez muita gente abandonar o computador para tarefas como assistir a filmes, navegar na internet e jogar. Desde então, o ritmo do surgimento de inovações eletrônicas parece ter diminuído. Esse marasmo, no entanto, está para acabar. Desta vez, a novidade é incentivada pelo Google. Começaram a chegar ao mercado os primeiros relógios inteligentes (smartwatches) com o Android Wear, versão do sistema do Google criada especialmente para aparelhos de pulso.
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Por enquanto, três grandes fabricantes anunciaram relógios com Android Wear. No começo de julho, nos Estados Unidos, a LG anunciou o G Watch, e a Samsung apresentou o Gear Live. Os dois são parecidos. A Motorola lançará até o fim de 2014 o Moto 360. A diferença é o design, com uma tela redonda, que deixa o smartwatch parecido com relógios mais elegantes. Dos três, apenas o G Watch, da LG, já está confirmado no Brasil. Chegará às lojas a partir de 21 de julho. Podemos estar diante da primeira tecnologia com capacidade de mudar a forma como interagimos com o mundo digital desde a chegada do iPad em 2010. Será que esses relógios com alma de smartphone virarão mesmo objeto do desejo popular?
O desafio não é novo. Há décadas que os relógios inteligentes e suas s capacidades dominam a fantasia popular. Suas funções mirabolantes foram retratadas no mundo do entretenimento. Em Jornada nas estrelas, o capitão Kirk usava um relógio para se comunicar com a nave Enterprise. Para James Bond, o agente 007, bastava um toque em seu relógio para explodir a base inimiga mais próxima. Nos últimos anos, houve várias tentativas fracassadas de lançar relógios inteligentes. Marcas de relógios como Seiko e Casio foram as primeiras a tentar criar algo similar a um smartwatch. O modelo da Seiko, RC-1000, lançado em 1984, se conectava com um computador via cabo e tinha uma memória ridícula, de 2 kilobytes. Nos últimos anos, empresas como IBM, Microsoft ou Sony tentaram fazer sucesso com modelos de relógios inteligentes e não conseguiram.
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Recentemente, os fabricantes começaram a acertar a mão. Uma pequena empresa americana chamada Pebble mostrou como os consumidores estão dispostos a comprar um smartwatch, desde que ele seja acessível e fácil de usar. O relógio, criado por ex-engenheiros da RIM, fabricante do BlackBerry, deveria custar apenas US$ 99 e funcionar com aplicativos desenvolvidos especialmente para o tamanho de sua tela. Em 2012, a Pebble abriu uma página no site de financiamento coletivo Kickstarter para tentar arrecadar US$ 100 mil em um mês. Em 28 horas, conseguiu US$ 1 milhão. Em um mês, US$ 10 milhões. Dois anos depois, mais de 300 mil Pebbles já foram vendidos. “A evolução da tecnologia nos deu as ferramentas certas para criar um relógio realmente inteligente”, diz Eric Migicovski, um dos criadores do Pebble. “As pessoas também estão prontas para eles, já que estão acostumadas com o mundo dos aplicativos no smartphone.”
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Para a nova safra de relógios com o sistema do Google encantar o consumidor e sacudir o mercado, ela precisa satisfazer duas condições básicas. A primeira é criar funções que justifiquem nosso desejo de pagar por um produto desses. A segunda condição é eles criarem uma nova forma – mais fácil e natural – de lidarmos com as máquinas para resolver nossos problemas cotidianos. Foi assim com o iPhone. Quando ele foi lançado, em 2007, havia outros celulares com até mais funções, como edição de planilha ou navegação em 3G. Mas o iPhone mudou tudo porque criou um novo jeito de usar a máquina, usando tela de toque e gestos naturais, como abrir os dedos para fazer o zoom. Se os relógios criarem uma forma mais eficiente de nos comunicarmos com as máquinas, terão sucesso.
Android para os pulsos (Foto: Divulgação / Ilustração: Daniel Graf)
O grande trunfo dos novos relógios é o sistema desenvolvido pelo Google a partir do Android, que domina 80% do mercado de smartphones no mundo. Com um relógio que roda a versão de pulso para o Android, o usuário consegue ver e-mails, mensagens, fazer ligações e usar diversos tipos de aplicativos sem precisar tirar o telefone do bolso ou da mochila. As notificações vêm com pequenas vibrações no pulso. Os comandos para as tarefas são acionados pela voz. Basta dizer “Ok Google”, seguido de “cheque meus e-mails”, “procure o endereço da padaria”, “verifique meus compromissos da tarde” etc. Isso poderá aumentar a produtividade. “É uma forma de garantir que você não deixará passar nenhuma mensagem relevante”, diz David Singleton, um dos engenheiros responsáveis pelo Android Wear. Também poderá dar mais conforto. “Olhar para o relógio é uma ação mais discreta do que puxar o telefone do bolso e navegar entre os aplicativos.”
Nos relógios, o Google aplicou uma evolução das tecnologias que desenvolveu para tentar se antecipar às informações de que precisamos. O Android Wear funciona com base numa tecnologia chamada Google Now. É um software que tenta, com base em seu histórico de uso, prever o que você pretende fazer. Dependendo do horário em que você entra em seu carro, o Google Now identifica se você vai para casa ou para o trabalho e indica o melhor caminho, sem que você precise buscá-lo. Se você compra uma passagem de avião e recebe o bilhete no Gmail (o e-mail do Google), o sistema avisa o horário em que você precisa sair de casa para não perder o avião e dá informação atualizada sobre o status do voo. Todas essas notificações espontâneas – com as mensagens, e-mails e SMSs – podem tornar esses relógios ótimos assistentes virtuais.
O sucesso dos relógios também dependerá da capacidade criativa e da empolgação dos desenvolvedores de aplicativos. São eles que aproveitam uma nova tecnologia e criam programas capazes de fazer o que nunca imaginávamos que queríamos. A tela de toque do iPhone o transformou num aparelho fantástico. Mas foi a loja de aplicativos, a App Store, que o transformou num computador de bolso. Para o G Watch, já há um aplicativo que se conecta com lâmpadas especiais da Philips e permite ligá-las e desligá-las pelo relógio. Na apresentação do Android Wear, o engenheiro do Google David Singleton simulou como fazer o pedido de uma pizza com dois ou três comandos rápidos de voz.
TOQUE DE GÊNIO Steve Jobs, fundador da Apple, no lançamento do iPhone, em 2007. Ele criou um novo jeito de usar as máquinas (Foto: Tony Avelar/AFP)
Mesmo com o sucesso do Pebble, muitos acreditam que os smartwatches são superestimados pelo mercado. Um dos grandes críticos é o americano Steve Wozniak, que fundou a Apple nos anos 1970 com Steve Jobs. Wozniak acredita que o smartwatch só “pegará” quando trouxer funções que vão além das oferecidas pelos smartphones. “Não há por que pagar caro por um aparelho que funcione apenas como atalho para meu celular”, diz Wozniak. “Comprei um Samsung Gear e o coloquei à venda dois dias depois.” No Brasil, o relógio similar ao testado por ele custa em torno de R$ 700. “Woz”, como é conhecido, não está sozinho. Um estudo recente da Endeavour Partners feito nos Estados Unidos mostrou que um terço dos americanos que compraram pulseiras eletrônicas para ginástica ou smartwatches abandonou os aparelhos após seis meses de uso por falta de interesse. “Talvez ainda leve mais dois ou três anos até que o mercado de smartwatches seja uma necessidade real para as pessoas”, diz o analista Jack Gold, consultor de tecnologia da J. Gold Associates, empresa americana que analisa tendências na indústria tecnológica.
Para os entusiastas da tecnologia, o sucesso do mercado de smartwatches está mais próximo que os mais críticos imaginam. Entre os principais fatores que contam a favor dessa nova geração de relógios inteligentes está a inevitável entrada da Apple na briga por esse mercado. Desde 2012, analistas que acompanham a Apple afirmam que 2014 será o ano do lançamento do iWatch, o smartwatch da empresa. Como de praxe, a Apple não revela detalhes de seus projetos. Questionado recentemente, Tim Cook, presidente da Apple, deu respostas evasivas. “Existem muitos aparelhos no mercado agora, mas não há nada de ótimo neles”, disse. A teoria amplamente aceita é que a Apple espera uma evolução maior das tecnologias de reconhecimento de voz, a forma mais natural para comandar as funções numa tela tão pequena. A Apple pode usar sua Siri (assistente que entende e responde comandos de voz), tecnologia já presente no iPhone, também no iWatch. A Microsoft lançou no início do ano uma assistente que conversa com o usuário, batizada de Cortana. Segundo rumores, a Microsoft deverá, ainda em 2014, lançar seu próprio relógio inteligente. Muitos jovens com menos de 20 anos cresceram sem desenvolver o hábito de usar relógio de pulso, porque aprenderam desde cedo a contar com seus smartphones para ver as horas. Ironicamente, os smartphones agora poderão fazer os relógios voltar à moda.

POR NATHALIA BIANCO E BRUNO FERRARI