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Ciclovias representam apenas 1% da malha viária das capitais no país. LEIA!

O Brasil tem hoje cerca de 70 milhões de bicicletas, mas quase não há lugares exclusivos e seguros para se trafegar, especialmente nas metrópoles. Para o especialista em mobilidade Alexandre Delijaicov, da Universidade de São Paulo (USP), o problema é que não é dada prioridade a quem realmente precisa. “Mais de um terço das viagens no país é feita a pé, a maior parte por uma população que não tem dinheiro para se locomover. Não construir calçadas mais largas e ciclovias é um absurdo”, diz.
O professor da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) diz que há um estímulo ao uso do carro por todos os lados. “Trata-se de um urbanismo mercantilista, que só colabora para piorar a construção coletiva da coisa pública.”
Apesar dos números, há municípios que têm dado uma atenção maior ao meio de transporte. A cidade campeã em ciclovias é o Rio de Janeiro (RJ). Ela é a que tem o maior número de vias: são 361 km, com previsão de chegar aos 450 km até 2016, ano dos Jogos Olímpicos. A prefeitura diz que são feitas 1,5 milhão de viagens de bike todos os dias.
“A bicicleta passou a fazer parte de um movimento de modernização como um modal de transporte de curtas distâncias, servindo como alimentador das redes de transporte de massa. Por ser 100% não poluente, também contribui para redução dos gases do efeito estufa”, diz, em nota, a Secretaria Municipal do Meio Ambiente do Rio.
Já Rio Branco (AC) tem a maior proporção em relação à malha (7,4%) e ao número de habitantes. Segundo o diretor da Superintendência Municipal de Transportes e Trânsito de Rio Branco, Ricardo Torres, a ordem na cidade é que sempre que for realizada uma obra de infraestrutura viária esteja previsto também o investimento no transporte não motorizado.
“Boa parte das ciclovias está na região periférica, onde está a população mais carente. Então há pessoas que até têm vale-transporte, mas que o passam para frente para conseguir uma renda extra e acabam utilizando a bicicleta, sobretudo operários da construção civil, trabalhadores de pequenas indústrias e da limpeza pública”, afirma.
Ele diz que não há um indicador preciso de que o trânsito esteja melhor, mas essa é a percepção geral da população. “Se toda essa parcela que utiliza a bike migrasse para o ônibus, a moto ou o carro, a situação ia complicar, com certeza.” O desafio agora, segundo ele, é interligar toda a rede e melhorar a estrutura cicloviária da área central.
Para se ter uma ideia, Amsterdã, capital da Holanda e cidade referência para o transporte em bicicletas, tem 400 km de ciclovias - e área territorial e população significativamente menor em relação ao Rio de Janeiro, por exemplo.
0 km
Apenas uma capital, Boa Vista, não possui nenhuma ciclovia implantada. A única via para bicicletas que a cidade já teve, de cerca de 3 km, jamais foi utilizada e acabou abandonada. Hoje, é utilizada por motoristas como estacionamento.

“Não houve uma campanha de educação para o uso dela, que foi tratada como uma extensão da calçada, já que passa na frente dos comércios. E como era só uma, juntou a falta de cultura de ciclovias com a continuidade da política de não criação desses espaços. Atualmente ela está toda descaracterizada”, diz o diretor-presidente da Empresa Municipal de Desenvolvimento Urbano e Habitacional de Boa Vista, Edgard Magalhães.
São Paulo, que tem 60 km de ciclovias, conta também com 121 km de ciclofaixas de lazer (que funcionam aos fins de semana e nos feriados) e 58 km de ciclorrotas (que possuem sinalização e pintura no solo), o que faz a cidade possuir a segunda maior malha cicloviária total.
Curitiba (PR) possui 127 km de ciclovias e Campo Grande (MS), 73 km. Cuiabá, com só 2 km, e Manaus, com 3 km, são as cidades com a pior relação entre o número de ciclovias e o número total de ruas.
Para Torres, de Rio Branco, o principal empecilho para a implantação de mais ciclovias não é técnico, e sim político. “Recurso você consegue, ajuda de arquitetos e engenheiros também. O difícil é quebrar o paradigma do carro, de ter vários estacionamentos.”
O professor Alexandre Delijaicov, da USP, concorda. “Trata-se de uma questão de mentalidade, o que é um problema gravíssimo para qualquer transformação visando a qualidade ambiental urbana, que possa gerar um bem-estar social. Do ponto de vista físico-territorial, de viabilizar essa rede de ciclovias, com investimentos públicos, recursos naturais e humanos, não há dificuldades”, diz.

Planos e projetos
Se depender dos planos e projetos das prefeituras, no entanto, essa realidade pode mudar em um ou dois anos. O levantamento do G1 mostra que as 26 prefeituras planejam implantar ao todo 1.200 km de ciclovias e ciclofaixas até o fim do 2014 ou ao término da gestão, dobrando a malha atual.

A Prefeitura de São Paulo, por exemplo, diz que a meta da gestão é implantar 400 km de infraestrutura cicloviária na cidade, sendo 150 km de ciclovias instaladas ao lado dos novos corredores de ônibus e 60 km de ciclovias que já têm projeto executivo concluído.
Entre as iniciativas, estão 27 km de calçadas compartilhadas na região de Parelheiros, na Zona Sul, que permitem o tráfego de ciclistas e pedestres. Na Zona Leste, está em fase de finalização um trecho de 17 km de ciclovia no Jardim Helena. A implantação foi feita após uma pesquisa do Metrô apontar a região como a que mais possui usuários de bicicleta no município. Além disso, segundo a prefeitura, o bairro é líder no ranking de acidentes envolvendo ciclistas e possui forte característica de integração intermodal com o sistema metroferroviário.
Manaus, que aparece em último no ranking de ciclovias por malha e por habitante, tem um plano ousado: construir 80 km até 2016. “O objetivo é oferecer não apenas um espaço para o lazer, mas principalmente um modal de transporte à população”, diz a administração municipal.
Já Boa Vista, que não conta com nenhum espaço atualmente, prevê a construção de quase 45 km de vias para bicicletas até o primeiro semestre do ano que vem. “A gente vai criar ciclovias com o conceito de meio de transporte mesmo, com origem e destino, interligando toda a cidade”, afirma Edgard Magalhães. “Hoje já há um alto uso de bicicletas. O que falta é uma infraestrutura. Isso também vai diminuir o número de acidentes envolvendo ciclistas.”

G1
WSCOM