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PT celebra vitória de ditador Ortega em eleição de fachada na Nicarágua


Na contramão das principais democracias ocidentais, o PT (Partido dos Trabalhadores) divulgou nota na noite desta segunda-feira (8) saudando as eleições de fachada na Nicarágua que confirmaram a permanência do ditador Daniel Ortega no poder.



No texto, a legenda classifica o pleito como "uma grande manifestação popular e democrática" e diz que o resultado confirma "o apoio da população a um projeto político que tem como principal objetivo a construção de um país socialmente justo e igualitário". 



Ao lado da mulher, Rosario Murillo, que ocupa formalmente o cargo de vice, Ortega disputou o comando do país contra cinco outros candidatos —todos parte do teatro do pleito de fachada, já que são aliados do governo. Nos últimos seis meses, o regime prendeu outros sete postulantes de oposição, acusados de lavagem de dinheiro e traição à pátria.



Entre eles estão Cristiana Chamorro, filha da ex-presidente Violeta Chamorro, que derrotou Ortega em 1990; Miguel Mora, fundador do canal 100% Notícias, desapropriado pelo regime; e o ex-embaixador Arturo Cruz. Também estão detidos outros 32 políticos opositores e mais de cem sindicalistas, jornalistas e ativistas de direitos humanos.



O pleito também não contou com observadores internacionais, que, na visão da Justiça local, alinhada ao regime, poderiam intervir no processo. Poucos jornalistas estrangeiros puderam entrar no país, e veículos independentes locais, a exemplo do site El Confidencial, impedidos de operar nos últimos meses, noticiaram sobre o pleito a partir da Costa Rica.



O PT, na nota, destacou ainda que a vitória de Ortega ocorreu "apesar das diversas tentativas de desestabilização do governo e do bloqueio internacional contra a Nicarágua e seu atual governo". O texto é assinado por Romenio Pereira, secretário de Relações Internacionais da legenda.



​Ao assumir, o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, manteve sanções impostas por seu antecessor, Donald Trump, que incluem multas e impedimento de entrada no país de altos funcionários do regime e familiares do ditador.



Após a reeleição, o democarata chamou o pleito de Manágua de farsa e disse que seu governo e a comunidade internacional devem usar "ferramentas diplomáticas e econômicas" para auxiliar os nicaraguenses e responsabilizar Ortega e Murillo.



Ele deve assinar um arsenal de medidas, com base na lei Renascer, para aumentar a pressão sobre o governo de Ortega. A situação na Nicarágua será debatida ainda na Assembleia-Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), que pode suspender o país do bloco regional. Analistas advertem, contudo, que um isolamento vai piorar a situação socioeconômica e provocará novo aumento da migração.



Assim como os EUA, a União Europeia adotou tom similar e afirmou, em comunicado, que as eleições "carecem de legitimidade" e "completam a conversão da Nicarágua num regime autocrático". O governo espanhol considerou o processo eleitoral um "escárnio" e a Costa Rica declarou que não reconhece o resultado das eleições.



Nesta segunda, Ortega reagiu às críticas de EUA e UE, classificando-os como "ianques imperialistas". "Eles querem estar acima do Conselho Supremo Eleitoral [...] contando os votos dos nicaraguenses", afirmou o ditador, em discurso de mais de uma hora. "Isso nunca mais irá acontecer na Nicarágua. Nunca mais."



Sobre os opositores presos, disse que "não são nicaraguenses, não possuem pátria".



O líder do país, por outro lado, conta com apoio do regime de Nicolás Maduro, na Venezuela —também apoiado pelo PT—, que felicitou o aliado. Já a Rússia chamou de inadmissíveis as contestações de países ocidentais. "Pelo que sei, quando terminou a votação a Casa Branca declarou sua recusa em reconhecer a eleição e convocou outros países a fazerem o mesmo. Consideramos isso inadmissível e condenamos veementemente tal política", disse o ministro de Relações Exteriores russo, Serguei Lavrov.



De acordo com os resultados oficiais, o ex-líder sandinista obteve 76% dos votos, consolidando sua permanência no cargo que ocupa ininterruptamente desde 2007. Ortega hoje domina, além do Executivo, o Legislativo e o Judiciário. Além dele, a eleição deste domingo apontou 90 membros da Assembleia Nacional. Segundo relatou o jornal La Prensa, houve apreensões na madrugada de domingo de integrantes dos partidos opositores Aliança Cidadã e Coalizão Internacional.



A repressão contra críticos acirrou-se em 2018, quando mais de 300 manifestantes foram mortos em confronto com as forças de segurança e grupos paramilitares alinhados ao ditador. Embora o regime tenha feito um acordo com a oposição no ano seguinte, prometendo eleições livres, o pacto não foi cumprido.



Em um primeiro posicionamento sobre a ditadura, feito em agosto deste ano, o ex-presidente Lula defendeu uma troca no comando do país. Em entrevista a uma TV mexicana, o petista disse que "na Nicarágua, seria bom ter alternância de poder". "Eu dizia ao [Hugo] Chávez, dizia ao [Alvaro] Uribe: toda vez que um governante começa a se achar insubstituível e começa a se achar imprescindível, está surgindo um pouco de ditadura naquele país."



Ele também aconselhou o ditador da Nicarágua, Daniel Ortega, a "não abrir mão" da democracia. "Se eu pudesse dar um conselho ao Daniel Ortega, daria a ele e a qualquer outro presidente. Não abra mão da democracia. Não deixe de defender a liberdade de imprensa, de comunicação, de expressão, porque isso é o que favorece a democracia", disse à jornalista Sabrina Berman, do Canal Onze do México.



Indagado pela jornalista mexicana sobre o que achava da Nicarágua, "um modelo de esquerda que arrasa a democracia", segundo ela, Lula respondeu: "Faz dez anos que não tenho contato com a Nicarágua, não sei muito bem o que está acontecendo lá. Mas tenho informações de que as coisas não andam nada bem por lá".


Folha de São Paulo