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China: "Lição nº 1 do combate à covid-19 é se preparar para o pior"

O ministro-conselheiro da Embaixada da China no Brasil, Qu Yuhui, afirmou em entrevista à imprensa brasileira na tarde desta sexta-feira (10) que a primeira lição que o país aprendeu durante a pandemia do novo coronavírus é de estar preparado para o pior.

“Estamos diante de uma doença perigosa e desconhecida, talvez conhecemos 10% dessa doença.


Por isso a China interditou a cidade de Wuhan, epicentro inicial da doença. Não foi fácil, mas valeu a pena. Conseguimos ganhar tempo não só para a China, mas para o mundo. Uma pesquisa mostra que, com essa medida, conseguimos reduzir, até 19 de fevereiro, 700 mil casos infectados”, afirmou.

Yuhui defendeu o isolamento como medida contra a disseminação da covid-19. “O isolamento rigoroso é essencial. Não para vencer a pandemia somente, mas para ganhar tempo para poder conhecer melhor a doença e nos preparar”, acrescentou.

O conselheiro, no entanto, disse que é possível compatibilizar o controle da pandemia com o desenvolvimento socioeconômico. “Não são duas coisas contraditórias, e sim podem ser trabalhadas ao mesmo tempo, mas com sacrifício.”

Yuhui comentou também os ataques racistas que o país vem sofrendo e da culpabilização do vírus ter aparentemente surgido em território chinês. “Pesquisas de sequenciamento genético do vírus mostram que a origem não é necessariamente na China, embora ainda não haja conclusão”, disse. O membro do governo chinês defendeu ainda que o momento pede uma cooperação global. “O jogo contra a covid-19  não será vencido pelo melhor jogador, e sim quando o pior jogador em campo aguentar o jogo”, afirmou.

As dificuldades de produção de equipamentos, principalmente respiradores, também são enfrentadas pela China. Yuhui disse que o país tem, atualmente, 1/5 de sua capacidade atuante. “Está havendo uma corrida por respirador. Temos limitações, como por exemplo a necessidade de peças de outros países para fabricar o produto. Nós dependemos de outros país nessa cadeia de produção, sobretudo nos respiradores invasivos”, ponderou.

Suposta demora da China para conter surto inicial 

Esse tipo de ataque na nossa opinião é infundado. Em 27 de dezembro uma médica reportou os três primeiros casos suspeitos, que não haviam sido detectados por outros médicos, e em 29 de dezembro o Centro de Controle de Doenças fez pesquisas. Em 30 de dezembro houve um aviso sobre uma pneumonia desconhecida e em 3 de janeiro a China começou de forma voluntária a trocar informações com a OMS e outros países e em 8 de janeiro conseguiu identificar causas patogênicas. Já em 11 de dezembro finalizou o sequenciamento genético compartilhando todos os resultados com comunidade internacional e OMS. Em 23 de janeiro, diante do perigo detectado, isolou a cidade de Wuhan. 

Por termos sido o primeiro país afetado tínhamos poucas informações e por isso levamos algum tempo para observar a gravidade e tomar medidas. Após dois meses do surto podemos ainda temos conhecimento limitado sobre a pandemia. 

Críticas de que a China estaria escondendo casos ou subnotificando

Essas críticas se devem ou por falta de informação científica ou para desviar a atenção. Quem tem dito sobre subnotificação são políticos de outros países e não cientistas. Essas pessoas duvidam dos sacrifícios que a China tem feito para conter o surto. Não sabem que o país conseguiu superar em tempo relativamente curto a pandemia. Não sabem o grau de esforço da China e da sua população tem feito para conter o coronavírus. A populaçãotem colaborado e profissionais de saúde que têm trabalhado 24 horas por dia. Cientistas diziam que só conseguíramos conter a pandemia em junho e conseguimos dois meses antes com suor e lágrimas da população da China, o que não foi compreendido por todos. 

Ataques xenófobos e racistas sofridos pela China em função do vírus

Tivemos onda de ataques racistas e xenófobos contra a China e outros países asiáticos. É verdade que o primeiro estudo de coronavírus foi registrado no país e isso não quer dizer que o vírus vem dele. Pesquisas de sequência genética mostram que a origem não é necessariamente na China. Mas antes da conclusão dessas pesquisas, temos que reconhecer que o rastreamento da origem de vírus é uma questão científica para que possamos conhecer e combater a doença, e não podemos aproveitar para politizar ou estigmatizar a questão.

A OMS é contrária à prática de associar o vírus a um país. Tal como a gripe H1N1, que causou a morte de meio milhão de pessoas. Ela surgiu nos EUA, mas ninguém quis responsabilizar um país pela propagação e nem chamar de vírus norte-americano. 

Ataques brasileiros à China

Há ataques lamentáveis associando a China à covid-19 e no Brasil continua sendo uma atitude lamentável que não condiz com o caráter acolhedor do País. Nesse momento precisamos de solidariedade, e não ataques. O jogo não vai ser vencido pelo melhor jogador do campo, mas só quando o pior jogador em campo conseguir aguentar o jogo. Por isso todos os países precisam se unir.

O governo chinês está oferecendo ajuda a 127 países e a 4 entidades internacionais, com EPIs e respiradores e doação de R$ 20 milhões à OMS. Enviando equipes de médicos a países e fazendo teleconferências. Além disso, das medidas do governo central, os governos locais, organizações e empresas já ofereceram material médico para mais de 100 países. Outra área que temos trabalhado é para aumentar a nossa produção de equipamentos e insumos para ajudar os outros países. Desde março já exportamos 3,8 bilhões de máscaras a mais de 50 países, 16 mil respiradores e quase 3 milhões de testes e assinamos acordo de compras para fornecer equipamentos e materiais.

Cooperação com o Brasil 

Com o Brasil estamos fazendo um intensivo trabalho para que a cooperação bilateral seja efetiva e eficiente. Há 3 semanas os presidentes Xi Jinping e Jair Bolsonaro conversaram e discutiram como os dois lados podem cooperar melhor em combate conjunto e, em janeiro, a Embaixada criou um diálogo permanente com o Itamaraty, a Anvisa e o Ministério da Sáude. Fizemos vídeoconferências entre médicos brasileiros e chineses. Governos federal e estaduais manifestaram interesse em contar com mais apoio chinês. Estramos trabalhando intensamente e o governo central da China está em fase final de negociação com Itamaraty para fornecer EPIs para o governo federal. Cerca de 10 províncias chinesas mandaram materiais para estados e municípios geminados. Temos 15 empresas chinesas em contato com os governos locais para doar 1 milhão de máscaras e respiradores, testes, luvas e etc.

Cooperação para aquisição de equipamentos

É um tema complexo pela quantidade de pedidos e é também uma ação de mercado. O governo chinês tem tentado fazer coleta de pedidos de aquisições, por vias diplomáticas e governamentais. Pedidos de 248 tipos de materiais do ministério e de 14 governos estaduais. O governo chinês fornece um catálogo dos exportadores chineses cadastrados para garantir qualidade e prazo de entrega e compradores vão negociar os termos dos contratos. O governo está fazendo o casamento de pedidos e demandas indicando os canais confiáveis para garantir a qualidade e compatibilização dos produtos em termos técnicos e para evitar revendas e especulações.

Quais são as lições aprendidas pela China? 

A lição número 1 é estar preparado para o pior. Estamos diante de uma doença perigosa e desconhecida, talvez conhecemos 10% dessa doença. Por isso a China interditou a cidade de Wuhan, epicentro inicial. Não foi fácil, mas valeu a pena. Conseguimos ganhar tempo não só pra china, mas para o mundo. Pesquisa mostra que com essa medida conseguimos reduzir, até 19 de fevereiro, 700 mil casos infectados. Ou seja, sim, sem essa medida estaríamos numa situação pior. Por isso o chefe de especialistas da OMS disse, na última coletiva de imprensa, que todo mundo deve um agradecimento especial a Wuhan, que fez um sacrifício. 

A segunda lição: o governo tem papel imprescindível nesse processo. Ele tem que adotar medidas sistemáticas. Não é questão simples de decretar a quarentena ou não, mas sim ao determinar uma série de medidas.



Por Mariana Londres e Plínio Aguiar