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Tribunal de Justiça nega embargos da defesa que pedia anulação do júri de policiais acusados de crime em Santana de Mangueira

O Tribunal de Justiça da Paraíba negou, na tarde desta terça-feira (23), os embargos defesa para anulação do júri em que foi citado ‘Os temidos do Júri 2019’, que supostamente teria ocorrido durante uma sessão na Comarca de Conceição. O relator foi o Desembargador Joás de Brito Pereira Filho. O júri foi presidido na ocasião pelo juiz Antonio Eugênio.

O júri ocorreu no dia 14 de maio de 2019 e só veio a terminar na madrugada do dia seguinte. Na ocasião os dois réus, um policial militar, José Alênio Leal Bezerra e um agente da polícia Francisco Renato Pereira, foram condenados a uma pena de 45 anos e 10 meses de reclusão.

No pedido, a defesa alegou que houve violação ao princípio da incomunicabilidade dos jurados, posto que criado um grupo de whatsapp intitulado “Os temidos do Júri de 2019”, “…exatamente um dia após a dissolução do corpo de sentença composto para julgamento deste caso, agendado inicialmente para o dia 9 de maio de 2019”, composto pelos 25 membros do corpo de sentença da comarca e presidido por Kallyza Karla Lopes de Lacerda Santos, a qual, inclusive, compôs o Conselho de Sentença.

Diz, ainda, ter tomado conhecimento da existência de outro grupo, chamado “PONTO A PONTO”, criado em 2018 e administrado por Ronaldo Adriano Gomes, e que é composto não só pelos vinte e cinco jurados convocados para a reunião do Júri, mas também por outros que figuraram em épocas passadas e por aqueles chamados como eventuais substitutos. Além da gravidade desse fato, alega ter tomado conhecimento de que, enquanto se dava o julgamento, a jurada Elaine Cristina Rodrigues, que compunha o Conselho de Sentença, “…VISUALIZOU uma mensagem postada pelo Sr. Romilson Ferreira Gomes, no Grupo “OS TEMIDOS DO JÚRI 2019”, pontualmente às 12h28min, momento no qual se realizava a oitiva das testemunhas de acusação, de modo que, a mencionada jurada já havia prestado seu compromisso, sendo advertida de seu dever de incomunicabilidade.

De acordo com a decisão do Desembargador Joás de Brito Pereira Filho, apesar da alegação de que se trata de fato grave, que atenta contra a incomunicabilidade do Júri, vê-se que todo o estardalhaço feito pela defesa leva a uma vala só: a de que não se fez prova alguma de qualquer interferência no julgamento, capaz de inquiná-lo de nulidade.

É que, segundo a decisão,  as afirmações de influência externa no animus dos jurados não passam, na verdade, de meras insinuações da defesa, não havendo elemento algum nos autos que demonstre tenham os membros do Conselho de Sentença sido contaminados por mensagens enviadas por meio do aplicativo whatsapp. Desse modo, não se mostra razoável concluir pela imparcialidade dos membros do Conselho de Sentença – nem mesmo daquela que se afirma ter visualizado uma postagem de pessoa estranha ao processo –, dado que não há prova de que tais mensagens tenham tido relação direta com o julgamento.

Ainda de acordo com a decisão, valem algumas observações que entendo oportunas. A defesa estranha o fato de ter sido criado o grupo um dia depois de adiado o julgamento. Mas, o pau que dá em Chico dá em Francisco, já diz o ditado. Não há dúvida que é uma situação que causa estranheza. Entretanto, quem foi o responsável pela criação do grupo? O Dr. Travassos não responde a essa questão, limitando-se a afirmar que a jurada Kallyza Karla Lopes de Lacerda Santos, que compôs o Conselho de Sentença, era quem administrava o referido grupo.

Leia a decisão na íntegra

APELAÇÃO CRIMINAL. NULIDADE ANTERIOR À PRONÚNCIA. PRECLUSÃO. CRIAÇÃO DE GRUPO DE WHATSAPP COMPOSTO POR JURADOS. QUEBRA DA INCOMUNICABILIDADE. FALTA DE PROVA DE QUE TAL TENHA INFLUENCIADO NA DECISÃO DOS JURADOS. NULIDADE INEXISTENTE. HOMICÍDIOS CONSUMADOS E TENTADO QUALIFICADOS. CONDENAÇÃO. DECISÃO CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS. INOCORRÊNCIA. PENA. FIXAÇÃO ACIMA DO MÍNIMO. FUNDAMENTAÇÃO ADEQUADA. RECURSOS DESPROVIDOS.

1. Não se declara a nulidade, por cerceamento de defesa, quando o advogado constituído pelo processado, conquanto tenha requerido, não teve vistas dos autos da ação cautelar de quebra do sigilo telefônico e não mais reclamou ao longo do processo, principalmente quando a matéria é arguida após a pronúncia e, assim, alcançada pela preclusão, já que não indicado o suposto defeito no momento oportuno.

2. Sem dados concretos de que influências externas, somente conhecidas depois do julgamento, tenham influenciado na decisão dos jurados, tudo não passando de meras ilações defensivas, inadmissível o reconhecimento de eiva capaz de inquinar de nulidade o veredicto popular por quebra de incomunicabilidade dos membros do Conselho de Sentença.

3. A decisão condenatória adotada pelo Conselho de Sentença, assentada na prova dos autos, produzida durante a instrução processual, que reconhece os acusados como os autores dos crimes de homicídio qualificado e de tentativa de homicídio qualificado, afastando, pois, a tese absolutória de negativa de autoria, não constitui pronunciamento manifestamente contrário ao acervo probatório

4. Fixadas as penas-base para os crimes de homicídio qualificado (dois consumados e um tentado) acima do mínimo com apoio em elementos objetivos que apontam para um maior juízo de censura na atuação do réu no delito e em razão da correta negativação da personalidade e conduta social dos agentes, bem assim das circunstâncias dos crimes, não há se falar em exasperação a configurar erro ou injustiça no tocante à fixação das penas.

5. Preliminares rejeitadas. Apelos desprovidos.

VISTOS, relatados e discutidos estes autos de apelação criminal, em que figuram como partes as acima identificadas:

ACORDA a Câmara Especializada Criminal do Tribunal de Justiça da Paraíba, em rejeitar as preliminares e, no mérito, negar provimento ao recurso, nos termos do voto do relator. Aproveito como relatório o lançado no acórdão desta Câmara Especializada Criminal que, rejeitando as preliminares suscitadas, no mérito, negou provimento ao recurso em sentido estrito interposto contra a decisão de pronúncia dos acusados, às fls. 879/890, vol. 05: “FRANCISCO RENATO PEREIRA JÚNIOR e JOSÉ ALÊNIO LEAL BEZERRA recorrem da sentença da lavra do MM. Juiz de Direito da 1ª Vara da comarca de Conceição, fls. 792/796, que os pronunciou a julgamento popular, recepcionando a acusação deduzida na denúncia de 

fls. 02/05, de que teriam sido eles, mediante paga ou promessa de recompensa e por meio cruel, os executores das mortes de Carlos Batista Pereira e Cicera Pereira da Silva, bem assim, do atentado à vida do infante Cícero Félix, aos quais não foi dado chance de defesa, fatos ocorridos na madrugada de 23 de abril de 2010, na rua Antônio de Sousa Mangueira, cidade de Santana de Mangueira/PB.

Em suas razões de fls. 805/820, vol. IV, após fazer referência à complexidade do caso narrado, que envolve concurso de pessoas e de fatos, exigindo, assim, redobrado cuidado do julgador para evitar nulidade por prejuízo à reação defensiva, reclama, preliminarmente, que ao corréu Francisco Renato não foi oportunizado novo interrogatório, depois de ouvida a última testemunha de acusação às fls. 727/729, nem se abriu às partes o prazo para requerimento de diligências, contrariando, assim, o disposto nos arts. 400 e 402, ambos do CPP.

 Alega, mais, que a testemunha mais importante, Thalia Batista de Sales, somente foi ouvida no inquérito e a ela foi apresentada apenas uma fotografia da pessoa que ela disse reconhecer como um dos autores da execução das vítimas, em afronta ao texto do art. 226 do CPP, tornando imprestável o reconhecimento.

 No mérito, reclama que, apesar de apontados os prováveis executores dos delitos, quais sejam, os elementos conhecidos por João Carnaúba e Beirinho, cujos nomes, segundo o sargento Dimaranze, foram difundidos pelos familiares das vítimas, isto porque um filho destas teria assassinato o filho do primeiro citado, nenhuma investigação foi feita sobre o tema, apesar de requerido ao magistrado.

 Aduz, ainda, a defesa dos recorrentes, que estes, segundo a prova, não podiam estar em Santana de Mangueira na madrugada do fato, eis que estavam bebendo em uma churrascaria na cidade de Porteira/CE. Por tais razões, e dizendo não haver indícios mínimos de participação nos fatos incriminados, roga a defesa a reforma da decisão 3 de pronúncia, “…absolvendo os réus dos crimes tipificados na denúncia de fls. 02-08”, fls. 820, vol. IV.

O recurso foi contrariado às. fls. 843/849, vol. IV, pugnando o Ministério Público Estadual, por seu representante legal, pela manutenção da decisão guerreada.

Mantido o ato censurado, fls. 850, os autos alçaram a esta Instância, onde a douta Procuradoria de Justiça, em parecer subscrito pelo Dr. Francisco Sagres Macedo Vieira, opina pelo desprovimento do recurso, fls. 862/872, vol. IV. […]”. Acrescento que, após recusados todos os recursos aviados, os acusados foram submetidos a julgamento popular, em sessão que se iniciou no dia 14, prolongando-se até o amanhecer de 15 de maio de 2019, tendo os jurados reconhecido que os acusados praticaram os crimes imputados.

Por isso, o Juiz-presidente firmou a sentença de fls. 1246/1253, vol. VII, condenando os réus, individualmente, à pena de 45 anos e 10 meses de reclusão. Não se conformando, os réus apelaram, fls. 1298/1299, vol. VII, José Alênio com suporte apenas na letra d do inciso III do art. 593 do CPP, e, Francisco Renato, com apoio em todas as alíneas do referido dispositivo processual.

Por intermédio da Defensoria Pública, dado que o seu patrono silenciou quando intimado, deixando escoar in albis o prazo legal, José Alênio Bezerra Leal apresentou razões às fls. 1447/1456v, dizendo ter a decisão dos jurados afrontado a prova dos autos e, por isso, pedindo a determinação de novo julgamento.

Alternativamente, pede a desclassificação do crime praticado contra o infante Cícero para a hipótese de lesão corporal culposa ou a redução das penas impostas. Já Francisco Renato reclama de nulidade do processo, posto que, embora tendo sido deferido pedido do seu patrono anterior para que lhe fosse dado vistas dos autos da medida cautelar de quebra de sigilo telefônico (processo n. 0000370-71.2010.815.0151), o mesmo nunca teve acesso ao feito, que foi arquivado.

E o novo advogado somente tomou conhecimento desse fato após o julgamento, quando do retorno dos autos principais à comarca para coleta das razões do recurso do outro réu, oportunidade em que ficou sabendo do desarquivamento da cautelar, de que constavam provas periciais favoráveis à defesa e que não foram ventiladas no processo.

Reclama, mais, de que, conquanto tenha protocolizado petição na cautelar em referência, solicitando pronunciamento da escrivania “… informando que aqueles autos foram arquivados SEM QUE FOSSE CONCEDIDA VISTA ao Patrono da Defesa…”, o que serviria para instrumentalizar os argumentos defensivos, o cartório atendeu à súplica, porém, em certidão “… que não atendeu absolutamente nada do que fora solicitado”, fls. 1503/1504, vol. VII.

Enfim, sustentando que os elementos constantes da cautelar eram de fundamental importância e que não foram explorados pela defesa em plenário porque disso não tinha conhecimento em razão do arquivamento dos respectivos autos, pede que seja anulado todo o processo, dado que “…a petição requerendo a habilitação e vista dos autos da ação cautelar fora protocolada no dia 25 de outubro de 2010, época muito anterior as alegações finais de defesa, não sendo oportunizado a defesa arguí-las em nenhum momento processual que antecedeu a sentença de pronúncia”, fls. 1506, vol. VII.

 Alega, ainda, em segunda preliminar, que houve violação ao princípio da incomunicabilidade dos jurados, posto que criado um grupo de whatsapp intitulado “Os temidos do Júri de 2019”, “…exatamente um dia após a dissolução do corpo de sentença composto para julgamento deste caso, agendado inicialmente para o dia 09 de maio de 2019”, composto pelos 25 membros do corpo de sentença da comarca e presidido por Kallyza Karla Lopes de Lacerda Santos, a qual, inclusive, compôs o Conselho de Sentença, fls. 1507, vol. VII.

Diz, ainda, ter tomado conhecimento da existência de outro grupo, chamado “PONTO A PONTO”, criado em 2018 e administrado por Ronaldo Adriano Gomes, e que é composto não só pelos vinte e cinco jurados convocados para a reunião do Júri, mas também por outros que figuraram em épocas passadas e por aqueles chamados como eventuais substitutos. Além da gravidade desse fato, alega ter tomado conhecimento de que, enquanto se dava o julgamento, a jurada Elaine Cristina Rodrigues, que compunha o Conselho de Sentença, “…VISUALIZOU uma mensagem postada pelo Sr. Romilson Ferreira Gomes, no Grupo “OS TEMIDOS DO JÚRI 2019”, pontualmente às 12h28min, momento no qual se realizava a oitiva das testemunhas de acusação, de modo que, a mencionada jurada já havia prestado seu compromisso, sendo advertida de seu dever de incomunicabilidade…”, fls. 1509, vol. VII.

Reporta-se, ainda, à interferência de terceiro, dado que, o Sr. João Marcílio Montenegro, conhecido por “Có”, motorista que, no dia da sessão, estava à disposição do Poder Judiciário, o qual teria enviado áudios via whatsapp a familiares das vítimas demonstrando satisfação pela condenação dos réus, tendo chegado ao conhecimento da defesa que essa pessoa, “além de amigo íntimo, possuía estreitas relações comerciais com os dois filhos das vítimas, o Sr. Rivaldo Pereira e o Sr. Damião Pereira, razão esta para a sua interferência direta no presente caso”, fls. 1510/1511, vol. VII.

Alega, ainda, haver adotado providências com vistas à apuração de todos esses fatos junto ao Juiz a quo, ao Ministério Público e à autoridade policial, inclusive com ingresso de Ação Cautelar de Exibição de Documentos (processo n. 0800765-15.2019.815.0151), em que buscava “a juntada do informativo de quem visualizou as mensagens nos dias 14 e 15 de maio de 2019, preferencialmente em formato de print direto do respectivo aparelho celular de cada um dos 12 (doze) membros do Grupo de Whatsapp ‘OS TEMIDOS DO JÚRI 2019’ (…), para que assim pudesse se ter uma noção da extensão das conversas travadas, bem como, saber quais os jurados que compuseram o corpo de sentença tiveram acesso ao celular durante o malfadado julgamento”, cuja tutela antecipada, mesmo com parecer favorável do Ministério Público, foi negada, denotando, com isso, a desídia do Juízo local em investigar os fatos noticiados.

No mérito, insiste na tese de que não há prova que o incrimine, até porque não houve reconhecimento formal, nos termos do art. 226 do CPP, sendo ilegal o realizado através de fotografia, de maneira que a decisão condenatória dos jurados foi tomada em manifesta contradição com a prova apurada. Alternativamente, pede a redução das penas impostas, aplicando-se a redução máxima quanto ao crime de homicídio tentado.

Às razões, a defesa de Francisco Renato Pereira Júnior anexou diversos documentos, inclusive gravados em mídia, os quais, à sua ótica, comprovam as nulidades apontadas. E ainda pediu que viessem a esta Instância, em apenso, os autos da ação cautelar de quebra de sigilo telefônico, fls. 1494/1529, vol. VII.

Em contrarrazões, o agente do Ministério Público local manifestou-se pelo afastamento das nulidades apontadas e, no mérito, pela integral manutenção da decisão popular e da sentença do Juiz-presidente, fls. 1573/1593, vol. VII. Nesta Instância, a ilustrada Procuradoria-Geral de Justiça opinou, em parecer da lavra do Dr. Luciano de Almeida Maracajá, pela rejeição das preliminares suscitadas e, no mérito, pelo desprovimento de ambos os recursos, fls.1610/1651, vol. VIII.

É o relatório

VOTO – Des. Joás de Brito Pereira Filho – Relator: Conheço dos recursos, presentes os pressupostos objetivos e subjetivos de sua admissibilidade. Os réus Francisco Renato Pereira Júnior e José Alênio Leal Bezerra foram denunciados, pronunciados e, ao final, condenados na comarca de Conceição, sob a acusação de terem executado, mediante paga ou promessa de recompensa e por meio cruel, as vítimas Carlos Batista Pereira e Cícera Pereira da Silva, bem assim, atentado contra a vida do infante Cícero Félix, aos quais não foi dado chance de defesa, fatos ocorridos na madrugada de 23 de abril de 2010, na rua Antônio de Sousa Mangueira, cidade de Santana de Mangueira/PB.

 Inconformados recorrem, os dois, a determinação de novo julgamento, sob o argumento de que o veredicto condenatório não encontra eco na prova apurada.

Nas razões do seu recurso, Francisco Renato erige duas preliminares de nulidade, as quais, por razões óbvias, devem ser analisadas antes do enfrentamento do tema comum (decisão do Júri manifestamente contrária à prova dos autos) por eles alegado.

Com efeito, alega esse acusado, como primeira prejudicial de mérito, a ocorrência de nulidade posterior à pronúncia (alínea a do inciso III do art. 593 do CPP), qual seja, o fato de ter o advogado que atuou na sua defesa, requerido, em 25 de outubro de 2010, vistas dos autos da ação cautelar de quebra de sigilo telefônico, instaurada para investigá-lo, vindo a ser o referido procedimento arquivado sem que o pedido tivesse sido atendido.

Aduz o subscritor das razões recursais, defensor que atuou no plenário do Júri, que, por estarem os autos arquivados, somente depois do julgamento, quando os autos estranhamente retornaram do arquivo, é que tomou conhecimento da existência do referido procedimento cautelar, do qual consta a conclusão de que “…não foi possível constatar o envolvimento dos alvos com o crime investigado, apenas alguns comentários acerca da prisão dos supostos envolvidos. De acordo com a análise dos dados, foi possível identificar alguns contatos mantidos entre os TMC’s conforme mostrados nos itens acima, porém, não foi possível constatar se os referidos alvos estiveram de fato na cidade de Santana de Mangueira na noite do duplo homicídio (…)”, fls. 1501/1502, vol. VIII. (Os destaques são do original).

Ao ver do apelante, portanto, em razão da não abertura de vistas ao antigo patrono do réu e do arquivamento dos autos da cautelar, esse dado, considerado de extrema relevância, deixou de ser explorado no plenário do Júri, trazendo, com isso, prejuízo à sua defesa.

Alega, ainda, o atual patrono do réu que, para sedimentar o argumento preliminar, solicitou certidão da escrivania, a qual não esclareceu se foi ou não dado vistas dos autos ao antigo advogado do réu, o que, à sua ótica, constitui mais um prejuízo, pois, com o documento, “tornaria mais fácil a demonstração dos fatos descritos, bem como iria instruir uma petição autônoma de um pleito que será apresentado futuramente, onde a mencionada certidão substituiria a juntada das cópias de um processo composto por 07 (sete) volumes”, fls. 1505, vol. VII.

Eu desconsidero o alegado erro quanto à certidão, por entender que a apontada nulidade – questão de fundo – não tem como ser reconhecida. E as razões, colho do dos seguintes trechos do parecer do Dr. Luciano Maracajá, às fls. 1619/1622, vol. VIII: “(…) Pois bem, este Procurador de Justiça, com o fim de elucidar a questão, destaca, inicialmente, que o apelante Francisco Renato Pereira Júnior contou, no decorrer da instrução criminal, com a atuação do advogado Josué Diniz de Araújo Júnior desde a data de 31/05/2010 (vide procuração às fls. 201/210) - tendo este causídico participado das audiências de instrução e julgamento, apresentado as alegações finais, em memoriais, do réu (vide fls. 742/752), interposto o Recurso em Sentido Estrito (f. 801) com as razões recursais (ff. 804/820) – até 05/05/2016, quando substabeleceu os poderes que outrora lhe foram constituídos pelo réu para o advogado Wilson Sales Belchior (vide fl. 875).

A petição a que se refere a defesa, nos autos da cautelar n° 0000370-71.2010.815.0151 foi subscrita pelo causídico Josué Diniz de Araújo Júnior aos 15/10/2010 (f. 202 dos autos apensos), tendo o pedido de arquivamento formulado pelo Representante do Ministério Público em atuação no caso sido subscrito aos 04/12/2014 (f. 305) e arquivado na mesma data (f. 306), certificando a Escrivaninha a publicação da decisão (f. 307).

 Ora, considerando a atuação do advogado Josué Diniz de Araújo Júnior , no caso, até a data de 05/05/2016 (vide fl. 875), verifica-se que teve informações da cautelar (vide fl.789/791) mas não arguiu nada sobre o fato de não haver sido intimado do seu teor, seja em sede de Alegações Finais (ff. 742/752) seja no âmbito do Recurso em Sentido Estrito (ff. 804/821). Além do mais, no plenário, durante os debates, nem o Promotor de Justiça nem a defesa dos réus fizeram uso do Relatório constante na cautelar (Ata às ff. 1254/1298), de maneira que não observa este Órgão Ministerial, portanto, a existência de nulidade, no caso, pelo alegado cerceamento de defesa.

Importante destacar que, de acordo com Brasileiro (2017, p. 1341), Formalidades essenciais são todas aquelas sem as quais o ato processual não pode ser considerado válido e eficaz. Ao dizer que a nulidade do art. 564, IV do CPP, considerar-se-á sanada se não for arguida em tempo oportuno, se, praticado por outra forma, o ato tiver atingido o seu fim, ou se a parte, ainda que tacitamente, tiver aceito os seus efeitos, o art. 572 do CPP sugere que a omissão de formalidade que 9 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA PARAÍBA Gabinete do Desembargador Joás de Brito Pereira Filho ApCrim 0000389-77.2010.815.0151 constitua elemento essencial do ato deva ser trata como causa de mera nulidade relativa. No caso concreto, por exemplo, entende-se que o novel advogado Braz Oliveira Travassos Torquato Netto, foi constituído como tal pelo acusado aos 12/09/2018 (vide procuração às fls. 1047/1049), oportunidade em que requereu vista dos autos para extração de cópias, pedido que foi devidamente deferido pelo juízo (vide fl. 1050).

Considera-se, portanto, pelo teor das informações constantes às fls. 789/791, que este advogado teve ciência da existência da cautelar, mas deixou de requerer vistas para fazê-lo após a realização do júri. Considerando-se tal fato, não deve ser acolhida a alegada nulidade, uma vez que a defesa constituída desrespeitou o teor do art. 572, II do CP P , ou seja, não arguiu a nulidade em tempo oportuno, deixando para fazê-lo segundo sua discricionariedade e conveniência. Observe, neste sentido, os excertos jurisprudenciais que rechaçam a possibilidade das chamadas “nulidades de algibeira” no sistema processual penal brasileiro:

 HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. NÃO CABIMENTO. NULIDADE AUSENTE. NÃO REALIZAÇÃO DE AUDIÊNCIA DE CONTINUAÇÃO. ATO DISPENSADO POR ACUSAÇÃO E DEFESA. PROVAS INQUISITORIA1S. CONFISSÃO. NULIDADE DE ALGIBEIRA. PRÁTICA NÃO TOLERADA PELA JURISPRUDÊNCIA. PRECLUSÃO. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO.

1 – A Terceira Seção desta Corte, seguindo entendimento firmado pela Primeira Turma do col. Pretório Excelso, sedimentou orientação no sentido de não admitir habeas corpus substitutivo do recurso adequado, situação que implica o não conhecimento da impetração, ressalvados casos excepcionais em que, configurada flagrante ilegalidade apta a gerar constrangimento ilegal, seja possível a concessão da ordem de ofício, em homenagem ao princípio da ampla defesa. II – “A jurisprudência dos Tribunais Superiores não tolera a chamada ‘nulidade de algibeira’ - aquela que, podendo ser sanada pela insurgência imediata da defesa após ciência do vício, não é alegada, corno estratégia, numa perspectiva de melhor conveniência futura. Observe-se que tal atitude não encontra ressonância no sistema jurídico vigente, pautado no princípio da boa-fé processual, que exige lealdade de todos os agentes processuais” (EDcl nos EDcl no AgRg no AREsp n. 1.382.353/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Ribeiro Dantas, DJe de 13/05/2019). III – In casu, trata-se de prática vedada em nosso ordenamento a apresentação de nulidades tardias, protelatórias, em especial, quando a própria d. Defesa foi quem lhes deu causa, ao menos, em parte, apenas como forma de tentar a absolvição, quando elas já eram, há muito, de conhecimento do insurgente (venire contra factum proprium). Habeas corpus não conhecido.

(HC 537.417/RJ, Rel. Ministro LEOPOLDO DE ARRUDA RAPOSO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/PE), QUINTA TURMA, julgado em 26/11/2019, DJe 03/12/2019). HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ESPECIAL. NÃO CABIMENTO. TRIBUNAL DO JÚRI. TENTATIVA DE CITAÇÃO PESSOAL. CASO CONCRETO. EVASÃO APÓS OS FATOS. PEDIDO DE ANULAÇÃO DA CITAÇÃO POR EDITAL. REVOLVIMENTO FÁTICO-PROBATÓRIO INVIÁVEL. NULIDADE DE ALGIBEIRA. PRÁTICA NÃO TOLERADA PELA JURISPRUDÊNCIA. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. […]. IV – In casu, citado por edital e determinada a suspensão processual, cerca de 22 (vinte e dois) anos após os fatos, o paciente nomeou patrono para alegar nulidades, assim tendo sido consignado no v. acórdão vergastado: “o comparecimento espontâneo aos autos através de advogado constituído somente depois de transcorrido o referido lapso temporal sugere a manobra de homizio até o aperfeiçoamento da prescrição, pois, caso desconstituída a suspensão do curso prescricional pela nulidade da citação por edital, conforme busca a defesa, ocorreria a extinção da punibilidade pela pena máxima abstratamente cominada ao tipo”.

Nesse sentido: “A jurisprudência dos Tribunais Superiores não tolera a chamada ‘nulidade de algibeira’ - aquela que, podendo ser sanada pela insurgência imediata da defesa após 1 ciência do vício, não é alegada, como estratégia, numa perspectiva de melhor conveniência futura. Observe-se que tal atitude não encontra ressonância no sistema jurídico vigente, pautado no princípio da boa-fé processual, que exige lealdade de todos os agentes processuais” (EDcl nos EDcl no AgRg no AREsp n. 1.382.353/SP, Quinta Turma, Rel. Min. Ribeiro Dantas, DJe de 13/05/2019). V –

Por consequência lógica, não há falar em revogação da prisão preventiva, cujo pedido apenas foi ancorado na pretensão de que os fatos estariam prescritos após a declaração de nulidade. VI – Por fim, tampouco houve ofensa ao direito ao interrogatório, primeiro, porque os autos se quedaram suspensos; e, segundo, porque o eg. Tribunal a quo não foi provocado a se manifestar sobre o assunto, o que enseja o reconhecimento da indevida supressão de instância. Precedentes. Habeas corpus não conhecido. (HC 509.983/GO, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 11/06/2019, DJe 17/06/2019).

Outrossim, deve-se destacar que a apreciação da apontada nulidade deve ser feita com base no princípio do Pas de Nullité Sans Grieü. Desse modo, ao contrário do que argumenta a defesa, a Cautelar de Interceptação Telefônica n° 0000370-71.2010.815.0151, além de ter sido deferida pelo Juízo a quo e ter seguido os trâmites legais, não chegou a expressar em seu relatório (vide fls. 226/236) prova irrefutável da inocência dos réus, observe o trecho do precitado documento: Mediante os fatos apurados durante os períodos de interceptação, não foi possível constatar o envolvimento dos alvos com o crime ora investigado, apenas alguns comentários acerca da prisão dos supostos envolvidos.

De acordo com a análise dos dados, foi possível identificar alguns contatos mantidos entre os TMC's conforme demonstrado nos itens acima, porém não foi possível constatar se os referidos alvos estiveram de fato na cidade de Santana de Mangueira na noite do duplo homicídio. […] (f. 236).

Além do mais, como já foi explícito, o teor material da cautelar não chegou a ser utilizado em plenário para convencimento dos jurados, seja pela acusação, seja pela defesa (Ata às ff. 1254/1298), de maneira que deve-se incidir, no caso, as disposições do art. 563 do CPP: “nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa. (…)”. A acrescentar apenas o fato de que é do advogado o dever de vigilância.

Ora, o antigo patrono do acusado sabia da existência da ação cautelar, tanto que pediu acesso aos autos. Então, se lhe foi dado manusear o feito, como requerido, por que não insistiu? Ao contrário, deixou correr o processo principal até a preclusão pro judicato da pronúncia, sem levantar qualquer questionamento a respeito durante todo esse tempo, quando foi substituído pelo profissional atual, que atuou no Júri.

Outra pergunta: quem garante que o Dr. Braz Oliveira Travassos Quarto Neto não tinha ciência da existência do processo? Será que não guardou a decantada nulidade para alegar somente no momento que lhe conviesse, ou seja, no caso de uma condenação, como de fato ocorreu? Se não se tem respostas para tais indagações, certo é que a defesa – que não se limita ao Dr. Josué Diniz de Araújo Júnior, estendendo-se ao profissional que o substituiu – não pode se beneficiar de sua própria desídia, que é exatamente o que representa o silêncio do então patrono do réu durante todo o curso da ação penal. Daí que, no caso, há de prevalecer o disposto no inciso V do art. 571 do CPP, segundo o qual, as nulidades ocorridas após a pronúncia deverão ser arguidas logo depois de anunciado o julgamento e apregoadas as partes. E não consta na ata de julgamento qualquer alegação nesse sentido (fls. 1254/1258, vol. VII), o que torna preclusa a matéria.

Em síntese, não se declara a nulidade, por cerceamento de defesa, quando o advogado constituído pelo processado, conquanto tenha requerido, não teve vistas dos autos da ação cautelar de quebra do sigilo telefônico e não mais reclamou ao longo do processo, principalmente quando a matéria é arguida após a pronúncia e, assim, alcançada pela preclusão, já que não indicado o suposto defeito no momento oportuno.

Ante tais considerações, rejeito a primeira prefacial suscitada. Alega, ainda, em segunda preliminar, que houve violação ao princípio da incomunicabilidade dos jurados, posto que criado um grupo de whatsapp intitulado “Os temidos do Júri de 2019”, um dia após a dissolução do do Júri composto para julgamento, agendado para o dia 09 de maio de 2019, composto por todos os convocados para a Reunião Periódica, e que era administrado por Kallyza Karla Lopes de Lacerda Santos, a qual, inclusive, compôs o Conselho de Sentença, fls. 1507, vol. VII.

Diz, mais, ter tomado conhecimento da existência de outro grupo, chamado “PONTO A PONTO”, criado em 2018 e administrado por Ronaldo Adriano Gomes, e que é composto não só pelos vinte e cinco jurados convocados para a reunião do Júri, mas também por outros que figuraram em épocas passadas e por aqueles chamados como eventuais substitutos. Reclama, ainda, que enquanto se dava o julgamento, a jurada Elaine Cristina Rodrigues, que compunha o Conselho de Sentença, visualizou mensagem postada pelo Sr. Romilson Ferreira Gomes, além do que, houve interferência do Sr. João Marcílio Montenegro, conhecido por “Có”, motorista que, no dia da sessão, estava à disposição do Poder Judiciário, o qual teria enviado áudios via whatsapp a familiares das vítimas demonstrando satisfação pela condenação dos réus.

No ponto, aproveito como parte integrante desta decisão o seguinte trecho que extraio do parecer, constante das fls. 1626/1633: “(…) Pois bem, no caso, como já restou descrito no Relatório do Processo (Item I do presente parecer), o Júri dos apelantes Francisco Renato Pereira Júnior e José Alênio Leal Bezerra fora inicialmente designado para a data de 09/05/2019 (vide fls. 1151/1167), tendo sido feita a escolha dos membros do Conselho de Sentença: Maria Edilian Soares Ferreira Henrique; Auanna Jeyce de Sousa Moura Soares; Alberlândio Lacerda Cavalcante; Joéliton Pucino de Sousa; Franciele Gomes de Sousa; Jorge de Oliveira Leite e Frankiele Barros de França. Ocorre que esta 14 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA PARAÍBA Gabinete do Desembargador Joás de Brito Pereira Filho ApCrim 0000389-77.2010.815.0151 sessão acabou sendo adiada para o dia 14/05/2019, em virtude da necessidade de ser feita acareação entre duas testemunhas.

Muito embora a defesa do recorrente explicite a criação de um grupo de Whatsapp pelos membros do corpo de jurados na comarca no dia seguinte à realização do 1° júri, este que foi adiado, não se pode reconhecer a existência de nulidade neste fato, uma vez que a incomunicabilidade só se estabelece antes do sorteio dos membros do Conselho de Sentença1 , este que, aos 10/05/2019 ainda não havia sido escolhido, já que o júri fora remarcado para a data de 14/05/2019 . 4

Já na data de 14/05/2019, constata-se que o Juiz Presidente atendeu aos comandos legais, tendo procedido ao sorteio do novel Conselho de Sentença: Antoniey Carla Xavier de Araújo Martins, Ingride Luciana Ferreira de Sousa, Jonathan Gomes de Oliveira, Wédja Xavier de Sousa Frade, Elcileny Ferreira Trajano, Elaine Cristina Rodrigues e Kallyza Karla Lopes de Lacerda Santos (vide ata à fl.1254), tendo sido destacado que: formado o Conselho de Sentença, foram, pelo MM. Juiz Presidente, dispensados os demais jurados. Em ato contínuo, pelo MM. Juiz foram feitas as advertências aos senhores jurados, de acordo com o artigo 462 do CPP, bem como da incomunicabilidade legal, por suspeição, em razão de parentesco com o Juiz, Promotor, Advogado, réu e vítima, e que uma vez sorteados não poderiam comunicar-se com outrem ou manifestar sua opinião sobre o processo, sob pena de exclusão do conselho e multa. Logo após, os jurados tomaram compromiss

o, conforme termo junto aos autos. (Ata, f. 1255). Segundo o doutrinador Lima (2017, p. 1214)2 , a incomunicabilidade dos jurados existe em virtude do sigilo das votações. O sistema processual penal brasileiro adota este instituto, cuja violação é causa de nulidade absoluta (CPP, art. 564, III, “j”, in fine). Por conta 1 Art. 466. Antes do sorteio dos membros do Conselho de Sentença, o juiz presidente esclarecerá sobre os impedimentos, a suspeição e as incompatibilidades constantes dos arts. 448 e 449 deste Código. § 1° O juiz presidente também advertirá os jurados de que, uma vez sorteados, não poderão comunicar-se entre si e com outrem, nem manifestar sua opinião sobre o processo, sob pena de exclusão do Conselho e multa, na forma do §2° do art. 436 deste Código. § 2° A incomunicabilidade será certificada nos autos pelo oficial de justiça. 2 LIMA, Renato Brasileiro de. Código de Processo Penal comentado. 2. ed. rev. e atual. Salvador: Juspodivm, 2017. 1.936 p. 15 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA PARAÍBA Gabinete do Desembargador Joás de Brito Pereira Filho ApCrim 0000389-77.2010.815.0151 da incomunicabilidade, explica o doutrinador3 , uma vez sorteados, os jurados serão advertidos que não poderão comunicar-se entre si e com outrem, nem manifestar sua opinião sobre o processo, sob pena de exclusão do Conselho e multa, no valor de 1 (um) a 10 (dez) salários mínimos, a critério do juiz, de acordo com a condição econômica do jurado (CPP, art. 466, §1°).

No caso concreto, nos autos. constata-se que os membros do Conselho de Sentença foram cientificados desta determinação legal (vide Termo de exortação à fl. 1225)., tendo o oficial de justiça atestado que estes não ficaram conversando ou que chegassem a informar qual o sentido dos votos individuais (vide Certidão de incomunicabilidade dos jurados à f. 1243). A defesa de Francisco Renato Pereira Júnior, entretanto, demonstrou, nos autos, que a jurada Elaine Cristina Rodrigues (ou a pessoa que se encontrava com seu aparelho telefônico celular e tinha acesso às suas mensagens no momento) visualizou, às 12h28min da data de 14/05/2019 (enquanto ocorria a sessão do júri), uma mensagem postada pelo Sr. Romilson Ferreira Gomes no grupo de Whatasapp intitulado “Os temidos do júri” (vide fls. 1543/1544).

A mensagem, que no caso é uma fotografia, explicita a carteira de jurado do senhor Ronaldo Adriano Gomes, contendo sua foto, seu nome, e os seguintes dizeres: O portador desta, cuja fotografia se vê no anverso, é integrante do quadro efetivo de jurados deste Tribunal do Júri, Comarca de Conceição-PB, a quem devem ser assegurados pelas autoridades competentes todas as prerrogativas da função, especialmente aquelas previstas nos artigos 295, inciso I e 437 do Código de Processo Penal pátrio. Conceição-PB, 14 de maio de 2019. Validade: 14 de maio de 2020. (Print de grupo de Whatsapp, f. 1543).

O que está em discussão, portanto, é: o fato da jurada Elaine Cristina Rodrigues ter visualizado esta foto, no grupo de Whatsapp intitulado “Os temidos do júri” implica quebra do compromisso de incomunicabilidade? Do ponto de vista doutrinário, se afirma comumente que “enquanto a sessão de julgamento não terminar, ficam os jurados incomunicáveis, significando que não podem voltar para casa, 3 Id. 1214. 16 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA PARAÍBA Gabinete do Desembargador Joás de Brito Pereira Filho ApCrim 0000389-77.2010.815.0151 nem falar ao telefone ou mesmo ler mensagens em celulares ou aparelhos semelhantes” (LIMA, 2017, p. 1214).

Aparentemente, a defesa do apelante se apega a este entendimento, sem embargo, este Procurador de Justiça destaca que a jurisprudência do STJ tem caminhado em sentido contrário, demonstrando que, para que se reconheça a nulidade processual pela quebra de incomunicabilidade, deve haver: a) a comprovação de efetivo prejuízo para a acusação ou para a defesa ( Pas de nullité sans grielf ); b) que o assunto não seja a causa, as provas ou o mérito da imputação. Observe os excertos: NULIDADE. INCOMUNICABILIDADE DE TESTEMUNHA. QUEBRA. AUSÊNCIA DE EFETIVA DEMONSTRAÇÃO DA OCORRÊNCIA. MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. SÚMULA 7 DO STJ. 1. A suposta quebra da incomunicabilidade das testemunhas só acarreta nulidade do ato se restar demonstrado o comprometimento da cognição do magistrado (HC 166.719/SP, Rel. Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 12/04/2011, D.Ie 11/05/2011). 2. “Não ocorre quebra de incomunicabilidade quando o jurado se comunica ou conversa, ainda que durante a sessão, mesmo com os demais membros do Conselho de Sentença, desde que o assunto não seja a causa, as provas ou o mérito da imputação […]” (REsp n. 1.440.787/ES, SEXTA TURMA, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, julgado em 07/08/2014, DJe de 3/9/2014). PENAL. AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. HOMICÍDIO QUALIFICADO. TRIBUNAL DO JÚRI. QUEBRA DE INCOMUNICABILIDADE ENTRE OS JURADOS. NÃO OCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE OPINIÃO POR PARTE DO JURADO. RITO DO ART. 212 DO CPP. AUDIÊNCIA DE INSTRUÇÃO E JULGAMENTO. NULIDADE RELATIVA. SÚMULA 83/STJ. CONSELHO DE SENTENÇA. JULGAMENTO CONTRÁRIO À PROVA DOS AUTOS. SOBERANIA. ACOLHIMENTO DE UMA DAS TESES. CONJUNTO PROBATÓRIO. SÚMULA 7/STJ. OMISSÃO. 17 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA PARAÍBA Gabinete do Desembargador Joás de Brito Pereira Filho ApCrim 0000389-77.2010.815.0151 VIOLAÇÃO DO ART. 619 DO CPP. NÃO OCORRÊNCIA. FUNDAMENTAÇÃO ADEQUADA.

1. Nos limites estabelecidos pelo art. 619 do Código de Processo Penal, os embargos de declaração destinam-se a suprir omissão, obscuridade ou contradição ou ambiguidade eventualmente existentes no julgado, o que não ocorreu na presente hipótese.

2. Se a decisão do Júri se encontra amparada em uma das versões constantes nos autos, deve ser respeitada, consagrando-se o princípio da soberania dos veredictos do Tribunal do Júri (art. 50, XXXVIII, CF).

3. Não houve exteriorização alguma de opinião por parte do jurado, que apenas indagou o recorrente a respeito de um fato. O jurado não emitiu a sua opinião e também não se dirigiu a nenhum outro jurado. Não há, assim, ilegalidade no presente caso. 4. Agravo regimental improvido. (AgRg no AREsp 403.800/MG, Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS JÚNIOR, SEXTA TURMA, julgado em 16/04/2015, DJe 29/04/2015). PENAL. PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. NULIDADE. DIVERGÊNCIA ENTRE O NOME DO MAGISTRADO QUE PRESIDIU A SESSÃO E O QUE ASSINOU A ATA DE JULGAMENTO. MERO ERRO MATERIAL. QUEBRA DA INCOMUNICABILIDADE DOS JURADOS. INOCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE ARGUIÇÃO NO MOMENTO OPORTUNO. PRECLUSÃO. PREJUÍZO NÃO COMPROVADO. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO.

1 O Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça não têm admitido o habeas corpus como sucedâneo do meio processual adequado, seja o recurso ou a revisão criminal, salvo em situações excepcionais, quando manifesta a ilegalidade ou sendo teratológica a decisão apontada como coatora.

2 Vigora no processo penal o princípio pas de nullité sans grief, segundo o qual “nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa” (art. 563 do CPP).

3. A divergência entre o nome do magistrado que presidiu a sessão e o que assinou a ata, 18 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA PARAÍBA Gabinete do Desembargador Joás de Brito Pereira Filho ApCrim 0000389-77.2010.815.0151 caracteriza mero erro material, o qual, por si só, não possui o condão de anular o julgamento do Tribunal do Júri. Tese não arguida em plenário, tomando o pleito precluso. 4. A quebra da incomunicabilidade pressupõe a exposição de opinião ou convicção do jurado sobre a lide em questão.

No caso dos autos, a jurada levantou-se para desligar o aparelho celular, não havendo comunicação com os demais jurados. Prejuízo não demonstrado.

5. Habeas Corpus não conhecido. (HC 241.198/PR, Rel. Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 01/12/2016, DJe 07/12/2016) PENAL. PROCESSO PENAL. RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. NULIDADE. QUEBRA DA INCOMUNICABILIDADE DOS JURADOS E DO SIGILO DAS VOTAÇÕES. PERGUNTA FEITA DIRETAMENTE AO ACUSADO. OPINIÃO EMITIDA POR DOIS JURADOS. VIOLAÇÃO DOS ARTIGOS 466, § 1°, E 473, § 2°, DO CPP. NÃO CARACTERIZAÇÃO

 RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS NÃO PROVIDO.

1 A afirmação contida na inicial, no sentido de que teria ocorrido quebra de incomunicabilidade dos jurados e a violação do sigilo das votações encontra-se isolada nos autos, inexistindo qualquer elemento no caderno processual que evidencie a manifestação de opinião, determinante a influir no juízo de valor do Conselho de Sentença 

2. A incomunicabilidade pressupõe a exposição de opinião ou convicção do jurado sobre a lide em questão, e, no caso dos autos, não se pôde aferir esta questão.

3. O rito em questão pressupõe prova pré-constituída do direito alegado, devendo a parte demonstrar, de maneira inequívoca, por meio de documentos que evidenciem a pretensão aduzida, a existência do aventado constrangimento ilegal suportado pelo paciente, o que não ocorreu.

4. Inviável desconstituir a conclusão de ausência de constrangimento ilegal sem o reexame do conjunto fático-probatório. 5. Recurso ordinário em habeas corpus não provido. (RHC 46.783/MT, Rel. Ministro 19 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA PARAÍBA Gabinete do Desembargador Joás de Brito Pereira Filho ApCrim 0000389-77.2010.815.0151 RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 25/10/2016, Me 09/11/2016). AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EXISTÊNCIA DE DOIS RECURSOS TEMPESTIVOS DE AGRAVO REGIMENTAL. ANÁLISE DO RECURSO PRIMEIRAMENTE INTERPOSTO. DECISÃO QUE NEGOU PROVIMENTO AO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL BASEADA EM FUNDAMENTOS AUTÔNOMOS. AUSÊNCIA DE ATAQUE A UM DOS FUNDAMENTOS. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA N. 182 DO STJ. DECLARAÇÃO DE UM DOS JURADOS. INEXISTÊNCIA DE INFLUÊNCIA DOS DEMAIS JURADOS. QUEBRA DE INCOMUNICABILIDADE NÃO CARACTERIZADA. DECISÃO RECORRIDA EM CONFORMIDADE COM O ENTENDIMENTO DO STJ. INCIDÊNCIA DA SÚMULA N. 7 DO STJ. AGRAVO NÃO PROVIDO.

1. Esta Corte tem decidido que “A interposição de dois recurso pela mesma parte e contra a mesma decisão impede o conhecimento do segundo recurso, haja vista a preclusão consumativa e o princípio da unirrecorribilidade das decisões” (AgRg no AREsp n. 501.898/SP, Rel. Ministro Raul Araújo, 4 T., DJe 5/6/2014).

2. Inaplicável a Súmula n. 182 em casos em que o agravante não ataca todos os capítulos de decisão baseada em fundamentos autônomos. Precedentes da Primeira e da Segunda Turma.

3. A afirmação de jurado de que “não tinha dúvidas quanto à autoria” não teve o condão de influenciar os demais jurados, porquanto pode significar tanto que entende ser o acusado culpado, quanto inocente de ser o autor do crime.

4. Analisar a demanda com o escopo de verificar se houve a alegada quebra de incomunicabilidade dos jurados e se tal ocorrência teria tido o condão de influenciar os jurados, ao ponto de trazer prejuízo ao agravante, demandaria o reexame do conteúdo fático-probatório dos autos, providência inviável em recurso especial, a teor da Súmula n. 7 deste STJ. Precedentes.

5. Agravo não provido (AgRg no AREsp 30.117/DF, Rel. Ministro ROGERIO 20 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA PARAÍBA Gabinete do Desembargador Joás de Brito Pereira Filho ApCrim 0000389-77.2010.815.0151 SCHIETTI CRUZ, SEXTA TURMA, julgado em 09/03/2017, DJe 16/03/2017). REGIMENTAL. AGRAVO EM RECUSO ESPECIAL. HOMICÍDIO. JURI. QUEBRA DA INCOMUNICABILIDADE DOS JURADOS. RECONHECIMENTO.

NECESSIDADE DE REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO DOS AUTOS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. RECURSO IMPROVIDO.

Não se verifica nulidade do julgamento popular por suposta quebra da incomunicabilidade dos jurados quando uma delas chora durante o depoimento da mãe da vítima, sem, porém, manifestar qualquer opinião acerca do mérito da imputação.

Desconstituir o entendimento proferido pelo Tribunal de origem, que consignou não ter o choro de uma das juradas influído no convencimento dos demais, tendo ela, indagada se estaria em condições de permanecer no Conselho de Sentença, afirmando que sim, esclarecendo que a emoção se deu por estar próximo ao dia das mães, exigiria o reexame do conjunto fático-probatório dos autos, inviável na via eleita ante o óbice da Súmula 7/STJ.

3. Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg nos EDcl no AREsp 1116435/GO, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 20/02/2018, DJe 07/03/2018). No caso concreto, não observa, este Procurador de Justiça, que a visualização da fotografia postada por Ronaldo Adrino Gomes , contendo sua foto, seu nome, e os dizeres já transcritos tenham implicado prejuízo para a acusação e para a defesa, uma vez que as informações que a jurada Elaine Cristina Rodrigues teve acesso não diziam respeito a causa, as provas ou o mérito da imputação do ora apelante.

Assim, pelo exposto, não deve ser reconhecida a nulidade alegada pela defesa, nos termos do art. 563 do CPP4 . Este mesmo argumento deve ser considerado em relação à irresignação defensiva concernente a suposta influência que servidor público do Município de Conceição-PB, Sr. João Marcílio Montenegro, conhecido por “Có”, que ficara a disposição do Poder Judiciário no dia 4 Art. 563. Nenhum ato será declarado nulo, se da nulidade não resultar prejuízo para a acusação ou para a defesa.

21 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA PARAÍBA Gabinete do Desembargador Joás de Brito Pereira Filho ApCrim 0000389-77.2010.815.0151 de realização da sessão do júri em discussão, teve em relação aos jurados. Muito embora a defesa tenha anexado o cd-rom contendo a transcrição dos áudios (f. 1545), não se constata, no caso concreto, que tenha havido atuação deste em modificar o ânimo dos jurados, principalmente quando há certidão, nos autos, atestando que estes permaneceram incomunicáveis entre si (vide fl. 1243).

Além do mais, como informou o Promotor de Justiça em suas contrarrazões recursais, o referido senhor “estava encarregado apenas pelo transporte dos equipamentos necessários para a realização da sessão do júri na Câmara Municipal de Conceição-PB, dada a existência de problema na refrigeração da sede do fórum” (f. 1590). Assim, deve-se conceber a respeito deste fato que “é teratológico conceber eventual nulidade do julgamento pelo simples fato da existência de diálogo entre terceiro estranho ao, julgamento do feito e supostas pessoas ligadas às vitimas”. (f. 1590).

Portanto, pelo exposto, deve-se fazer incidir as disposições do art. 566 do CPP em relação a esta questão, ou seja, “não será declarada a nulidade de ato processual que não houver influído na apuração da verdade substancial ou na decisão da causa. (…)”. Na verdade, apesar da alegação de que se trata de fato grave, que atenta contra a incomunicabilidade do Júri, vê-se que todo o estardalhaço feito pela defesa leva a uma vala só: a de que não se fez prova alguma de qualquer interferência no julgamento, capaz de inquiná-lo de nulidade.

É que, as afirmações de influência externa no animus dos jurados não passam, na verdade, de meras insinuações da defesa, não havendo elemento algum nos autos que demonstre tenham os membros do Conselho de Sentença sido contaminados por mensagens enviadas por meio do aplicativo whatsapp. Desse modo, não se mostra razoável concluir pela imparcialidade dos membros do Conselho de Sentença – nem mesmo daquela que se afirma ter visualizado uma postagem de pessoa estranha ao processo –, dado que não há prova de que tais mensagens tenham tido relação direta com o julgamento. Aliás, como observado no parecer, nos trechos transcritos, não há evidência de que os jurados tenham sido influenciados por ações externas.

Pelo 22 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA PARAÍBA Gabinete do Desembargador Joás de Brito Pereira Filho ApCrim 0000389-77.2010.815.0151 contrário, permaneceram incomunicáveis durante todo o processo de julgamento, como bem o atestaram os oficiais de justiça, fls. 1243, vol. VII. Por sinal, valem algumas observações que entendo oportunas.

A defesa estranha o fato de ter sido criado o grupo um dia depois de adiado o julgamento. Mas, o pau que dá em Chico dá em Francisco, já diz o ditado. Não há dúvida que é uma situação que causa estranheza. Entretanto, quem foi o responsável pela criação do grupo? O Dr. Travassos não responde a essa questão, limitando-se a afirmar que a jurada Kallyza Karla Lopes de Lacerda Santos, que compôs o Conselho de Sentença, era quem administrava o referido grupo.

Daí mais duas perguntas, cuja resposta fica no limbo: quem garante que esse grupo de watszapp não foi criado por alguém ligado ao próprio acusado? E, como afirmar que foi mesmo Elaine Cristina Rodrigues que “visualizou” a mensagem – até porque não há prova, nem a defesa a isso se reporta, que os integrantes do Conselho de Sentença tenham permanecido com celulares à disposição no curso da sessão – e, mais ainda, que tenha essa jurada votado contra ou a favor do imputado, se o resultado é divulgado apenas quando alcançada a maioria num ou noutro sentido?

Vale dizer, ainda, apenas para melhor ilustrar, que, somente quatro votos foram abertos e lidos, sendo os demais dispensados, já que os quatro primeiros divulgados decidiram pela condenação dos réus. Logo, não se pode afirmar quem votou em favor ou contrário à defesa do imputado Francisco Renato, já que os demais votos ficaram submetidos a sigilo. Em outras palavras, a falta de respostas a tais indagações dá lugar a uma série de interpretações, dentre as quais – e aqui não é uma afirmativa, mas mera suposição – a de que alguém pode ter criado o grupo com o intuito de, mais tarde, em caso de condenação, fundamentar a alegação de nulidade do julgamento, como de fato ocorre na hipótese.

Verdade é que, abstraídas tais questões, a defesa, apesar de todo o esforço dispendido, não conseguiu demonstrar em que a criação do grupo tenha exercido influência na decisão dos jurados. Tudo navega no campo da 23 suposição, o que não se presta a dar lastro ao reconhecimento da nulidade do júri. Por igual, também não se vê no que a “comemoração” do Sr. João Marcílio Montenegro, conhecido por “Có”, motorista que, no dia da sessão, estava à disposição do Poder Judiciário, tenha alguma relação com a decisão dos jurados, capaz de dar causa à anulação do Júri, até porque, não se tem notícia – nem a defesa cuidou de trazer prova nesse sentido – de que esse cidadão tenha mantido contato com os jurados que integraram o Conselho de Sentença durante a sessão de julgamento.

Nesse caso, sem dados concretos de que influências externas, somente conhecidas depois do julgamento, tenham influenciado na decisão dos jurados, tudo não passando de meras ilações defensivas, inadmissível o reconhecimento de eiva capaz de inquinar de nulidade o veredicto popular por alegada quebra de incomunicabilidade dos membros do Conselho de Sentença.

E com tais considerações, também rejeito a segunda preliminar suscitada. No mérito, a decisão do Júri condenando ambos acusados pelos dois homicídios qualificados consumados e pela tentativa de homicídio qualificado encontra respaldo na prova. E isso ficou bem claro quando da decisão que negou provimento ao recurso em sentido estrito interposto contra a decisão de pronúncia. Senão, vejamos: “[…] No caso, a materialidade restou comprovada pelos laudos de exame cadavérico, acostados aos autos. No que diz respeito à autoria, a negativa dos recorrentes, por suas razões expendidas, não prosperam neste momento, porquanto não são capazes de afastar os indícios verificados nos autos. Corroborando com a versão da adolescente Thalia Batista, o agente de investigação da Polícia Civil, Charles Aliguiere Moura de Oliveira, o qual participou do caso em tela, fez constar em seu termo de depoimento a fl. 26, posteriormente ratificado em Juízo (fls. 648/V e 649) que “(…) pela experiência policial que possui acha que os autores do delito realmente foram FRANCISCO RENATO e JOSÉ ALÂNIO LEAL BEZERRA, pois estiveram na cidade de Conceição na noite anterior à prática do crime, estiveram dias antes na cidade de Santana de Mangueira e ainda são conhecidos como seguranças particulares do principal suspeito de ser o mandante do crime, Prefeito Municipal de Curral Velho, LUIZ CARNAÚBA, irmão de JOÃO CARNAÚBA, pai do indivíduo morto pelo filho do casal/ vítimas, de alcunha ‘filhinho’ (…)”.

Os réus negaram os fatos, alegando que passaram por Conceição/ PB na noite do dia 22/04/2010, que antecedeu o fato aqui tratado, de onde retornaram para as cidades de Porteira /CE e Jardim/ CE, onde teriam chegado por volta da meia-noite. Com efeito, Francisco Renato Pereira Júnior informou, às fls. 403/405, que estivera em Conceição naquela noite de 22 de abril de 2010, na companhia do outro imputado, saindo, ambos, “… por volta das 20h00min, com destino a Porteiras-CE; que ficou em Porteiras-CE, até, mais ou menos, por volta das 23h00min; que chegou em Jardim-CE, local onde reside, por volta das 24h00min (…)", horários que se chocam com os reportados pelas testemunhas José Francisco de Sousa Filho e João Paulo de Sousa, indicadas pela própria defesa, os quais disseram ter estado com os dois imputados até por volta das 21h30min ou 22h00min, quando eles supostamente teriam deixado a cidade, fls. 318/319. A mesma contradição é detectada no testemunho do Sgt/PM Dimaranze Ramalho da Silva, às fls. 724/726, que disse ter se encontrado com os acusados na Companhia de Polícia por volta das 19h00min, com o acréscimo de que “…os acusados estavam usando um veículo FOX, de cor escura; (…) que os mesmos ficaram por lá meia hora e depois saíram dizendo que iam para Itaporanga (…)”.

Outro detalhe que serve de elo entre os réus e os fatos incriminados é o laudo técnico de confronto balístico de fls. 177/190, atestando que as cápsulas encontradas no local dos crimes e aquelas deflagradas, apreendidas em poder do acusado Francisco Renato, fls. 29, foram expelidas pela mesma arma, qual seja, uma pistola calibre 9 mm, sem contar que, submetido a exame de residuograma, também se detectou a presença de cátion chumbo na mão direita do mesmo imputado.

Em outras palavras, o reconhecimento feito pela menor Thalia Batista, o testemunho do agente civil Charles Aliguiere Moura de Oliveira, as contradições entre as versões dos réus e as das testemunhas José Francisco de Sousa Filho, João Paulo de Sousa e do Sgt/ PM Dimaranze Ramalho da Silva quanto aos horários em que os mesmos teriam se encontrado na cidade de Conceição, além da convergência entre as cápsulas encontradas com o primeiro apelante e aquelas encontradas na cena do crime, expelidas, segundo a prova técnica, pela mesma arma, formam um conjunto de indícios concretos, que justificam a submissão dos réus a julgamento popular. Isso basta para dar sustentação à decisão de pronúncia, que não precisa de prova plena e absoluta, juízo de certeza de ser o acusado o autor (material ou intelectual) do homicídio, posto que, como sabido, constitui mero juízo de admissibilidade da acusação. […]”, fls. 886/887, vol. V.

E foi nesses elementos, acima apontados, que estão nos autos, que os jurados se apegaram para condenar os acusados, o que afasta a tese de que decidiram em manifesta contradição com o acervo probatório. A versão soberanamente por eles acolhida já constava dos autos desde o seu nascedouro, de forma que, o Conselho de Sentença, ao optar por ela por entender ser a versão correta, decidiu com apoio na prova apurada, sendo, pois, incabível a anulação do decisum, ex vi da soberania dos veredictos populares. Portanto, se os jurados acataram a tese que lhes pareceu mais adequada, em conformidade com versão idônea e com os demais elementos de convicção que lhes foram expostos, obviamente – repita-se – não se pode cogitar da alegada caracterização de decisão manifestamente contrária à prova dos autos.

É a jurisprudência: “PENAL E PROCESSUAL PENAL. HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUALIFICADO. NEGATIVA DE AUTORIA. REJEIÇÃO. CONDENAÇÃO. DECISÃO CONTRÁRIA À PROVA DOS AUTOS. INOCORRÊNCIA. EXISTÊNCIA DE DUAS VERSÕES NOS AUTOS. PENABASE. REDUÇÃO. INADMISSIBILIDADE. RECURSO. DESPROVIMENTO.

A submissão do réu a novo julgamento, sob o pálio de a decisão do Júri ser manifestamente contrária à prova dos autos, somente é possível quando o Conselho de Sentença adota tese integralmente incompatível com os elementos colacionados no processo, o que não ocorre quando os jurados optam por uma das versões críveis existentes nos autos.

 Se a pena-base para o crime de homicídio duplamente qualificado está amparada nos elementos constitutivos providos de fundamentação objetiva que apontam para um maior juízo de censura na atuação do réu no delito, não há se falar em exagero na dosimetria.

3. Apelo desprovido.” (TJPB – ACÓRDÃO/DECISÃO do Processo Nº 0001322-48.2017.815.0331, Câmara Especializada Criminal, Relator DES. JOÁS DE BRITO PEREIRA FILHO, j. em 18-02-2020). Ex positis, respaldada a decisão condenatória do Júri nas provas constantes dos autos, deve esta ser mantida, em face do já mencionado princípio da soberania do veredicto popular, inclusive no que se refere ao delito de homicídio tentado contra o infante Cícero, por ter entendido os jurados, também com apoio no acervo probatório, o intento homicida dos agentes também em relação a essa vítima.

Quanto ao argumento de que as penas-base foram exacerbadas, também não prospera. Em verdade, além do alto grau de reprovabilidade das condutas, vê-se que os acusados invadiram a residência das vítimas, que dormiam inocentemente, as quais foram fria e barbaramente assassinadas (duas delas), enquanto a pobre criança somente escapou porque foi protegida pelo corpo da  avó. Uma chacina, praticada em circunstâncias dantescas, o que, por si só, justifica o distanciamento da reprimenda em relação ao mínimo.

Acho até que, pelas circunstâncias negativadas (culpabilidade, personalidade, conduta social e circunstâncias dos crimes), o douto Juiz foi até parcimonioso, posto que, se o quisesse, até poderia aplicar a base em patamar mais elevado para cada crime praticado. Em suma, fixadas as penas-base para os crimes de homicídio qualificado (dois consumados e um tentado) acima do mínimo com apoio em elementos objetivos que apontam para um maior juízo de censura na atuação do réu no delito e em razão da correta negativação da personalidade e conduta social dos agentes, bem assim das circunstâncias dos crimes, não há se falar em exasperação a configurar erro ou injustiça no tocante à fixação das penas.

Assim, não merece acolhida o pleito relativo à diminuição da pena-base, porquanto devidamente justificado o recrudescimento operado em relação ao piso. Por tais razões, rejeitadas as preliminares e mantidas a decisão dos jurados e as penas impostas, nego total provimento aos apelos. É como voto. Presidiu a sessão o Excelentíssimo Senhor Desembargador Joás de Brito Pereira Filho, Presidente da Câmara Criminal.

Participaram do julgamento os Excelentíssimos Senhores Desembargadores Joás de Brito Pereira Filho, relator, João Benedito da Silva, revisor, e Arnóbio Alves Teodósio (vogal). Ausente justificadamente o Des. Carlos Martins Beltrão Filho Sala de Sessões da Câmara Criminal “Des. Manoel Taigy de Queiroz Mello Filho” do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba, em João Pessoa, 07 de julho de 2020. Desembargador Joás de Brito Pereira Filho

 

 

Assessoria da Justiça