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Eleitores não se interessam por propaganda política

Estamos a pouco mais de cinco meses das eleições e, com o passar do tempo, o rito político começa a ficar cada vez mais presente no dia a dia das pessoas. Já estão se formando as primeiras chapas, os anúncios das primeiras pré-candidaturas, quem vai postular vaga à Câmara Federal, quem vai se candidatar à Assembleia Legislativa e também ao Senado Federal.

A partir do dia 16 de agosto, começam, de fato, as propagandas eleitorais gratuitas.
Passarão a ser permitidas a realização de comícios, carreatas, distribuição dos famosos “santinhos” e também a divulgação eleitoral via internet, essa com uma peculiaridade, pois não pode ser patrocinada. Já o horário eleitoral gratuito, veiculado na televisão e no rádio começará apenas no dia 31 de agosto.

O Portal Correio decidiu ouvir tanto os eleitores, quanto um cientista político e também políticos e partidos, sobre o período de propaganda eleitoral para saber se isso, de fato, ajuda ou não para decidir em quem votar e se é bom ou não para os candidatos divulgarem seus projetos e ações para a população.

O Portal Correio quis saber a opinião dos leitores sobre o assunto e realizou uma enquete durante uma semana perguntando o seguinte: “Você acha que propaganda eleitoral, debates e comícios ajudam a escolher um candidato?”.

Mais de 50% (52,4%) respondeu que não, que a propaganda eleitoral, os debates e os comícios não influenciam na escola do candidato. Outros 34,8% acreditam que esses eventos podem sim servir como forma de conhecer os postulantes aos cargos públicos e, consequentemente, ajudar na escolha. Ficaram indecisos e disseram que talvez isso possa influenciar, 12,7% das pessoas que responderam a consulta.

Ao todo, 1.349 pessoas votaram, sendo que 707 disseram não ser influenciados por esses eventos, 470 que afirmaram ser influenciados e outros 172 que ficaram indecisos e reponderam ‘talvez’.

Políticos e partidos

Apesar da aparente antipatia da população à propaganda político-eleitoral, dirigentes partidários consideram o instrumento como meio eficaz e defendem a sua utilização. De acordo com o presidente estadual do PSDB, Ruy Carneiro, apesar da internet, uma parcela significativa das pessoas ainda acompanha a veiculação dos programas no rádio e na televisão.

Segundo o tucano, as inserções que são veiculadas ao longo do dia têm uma importância muito grande “Antes tê-las do que não tê-las”, comentou.

Sobre o conteúdo a ser veiculado, Ruy disse que o partido realiza pesquisas de opinião junto à população para decidir o que abordar nos programas.

O deputado Efraim Filho (DEM), membro da executiva estadual da legenda, disse que os eleitores ainda acompanham o discurso dos políticos, principalmente nos comícios.  De acordo com ele, o horário político vem despertando a falta de interesse da população devido à plataforma em que é pensado, mas ressaltou que a ferramenta é utilizada com mais frequência pela população nas grandes cidades.

Efraim lembrou que tanto a propaganda política quanto os comícios continuam sendo estratégias válidas, mas necessitam estar em sintonia coma sociedade. “O povo está em busca de propostas verdadeiras, não tolera mais discursos demagógicos e candidatos fabricados dentro de um estúdio. O que se quer hoje é que o candidato seja autêntico, que olhe no olho da população”, afirmou.

Já o presidente do PPS, Nonato Bandeira considerou importante a divulgação das ideias, mas lembrou que tudo deve ser feito com disciplina. Ele também defendeu a realização da mais debates com os candidatos, cara a cara, para que a população conheça mais fundo a trajetória dos postulantes.

Para Nonato, o que precisa acontecer é o fim da propaganda com pirotecnia, com ‘cosméticos’. “É preciso focar nas ideias, e que as coisas sejam feitas às claras, sem maquiagem”, observou.

Cientista explica

O cientista político José Artigas falou sobre o processo eleitoral de 2018 e comentou aspectos novos das campanhas e seus respectivos efeitos no resultado do pleito. Para ele, mesmo existindo nos dias de hoje outros meios de divulgação, como as redes sociais, ainda vale a pena para os candidatos a busca por se ter maior tempo disponível para propaganda em rádio e TV, meios que alcançam boa parte do eleitorado.

“Ainda vale muito investir nesse tipo de mídia, especialmente nessas eleições, que terão uma redução imensa de tempo, tanto de campanha quanto de propaganda nos meios de comunicação, além de ser a primeira sem dinheiro doado por empresas, sobrando menos recursos para outros tipos de exposição, como ‘santinhos’, panfletos, etc. Pesquisas da ciência política apontam caráter decisivo no tempo de rádio e TV, inclusive nas candidaturas proporcionais (vereadores e deputados). Quanto menor o tempo, o acesso do ‘eleitor médio’ será prioritariamente por rádio e TV. Não é algo determinante, mas é condicionante da competitividade. Não garante a eleição, mas é muito importante”, diz Artigas.

O cientista político considera que as alterações feitas na legislação mudam a dinâmica do sistema eleitoral, porque, conforme argumenta, acaba ocorrendo um favorecimento de candidatos mais conhecidos, sobretudo os que já têm mandatos, podendo haver uma diminuição da renovação política. “Com campanha curta é muito difícil surgirem caras novas”, declara. Ele acrescenta a isso o fato de que houve pouca mudança no perfil do eleitor: “Não mudou muito. Continua uma grande desinformação. O eleitor em geral é muito desinformado e escolhe candidatos de ultima hora”.

Para garantir um tempo maior de propaganda em rádio e TV, muitos partidos buscam fazer coligações, uniões que muitas vezes deixam as ideologias partidárias de lado em prol de uma exposição maior. José Artigas critica esse sistema vigente no País.

“O Brasil é o único país do mundo em que ainda existe essa excrescência de coligação em âmbito proporcional. Com isso, acaba acontecendo uma distorção da vontade do eleitor. Para se ter uma ideia, pesquisas indicam que, atualmente, dos 513 deputados federais, apenas 36 foram eleitos com seus próprios votos. Os demais foram com redistribuição de votos ‘sobrantes’. É uma plena descaracterização da intenção do eleitorado e ainda reforça outro dado histórico: cerca de 70% dos eleitores não lembram em quem votaram nas candidaturas proporcionais nas eleições anteriores”, revela.

Artigas ressalta também o desequilíbrio existente entre campanhas de partidos pequenos e as legendas de grande expressão nacional e suas respectivas coligações, que, além de disporem de maior tempo de rádio e TV, ‘abocanham’ grande parte do fundo eleitoral, criado para financiamento público de campanha, podendo investir em melhores estratégias de marketing, comícios, carreatas, dentre outros artifícios.

“Há uma desigualdade pressuposta e fundo partidário distribuído de forma que já cria uma desproporção enorme. Há também a cláusula de barreira, calculada a partir do quociente eleitoral (fruto da divisão de votos válidos pelo número de cadeiras disponíveis). Quem não atinge o quociente não pode se eleger. Isso limita o desempenho dos partidos pequenos nas urnas”, explica o cientista, que julga que o financiamento público de campanha é melhor que o empresarial, mas que ainda há muito a se evoluir. “É a melhor maneira, mas ainda tem que se avançar muito. Ainda não há um controle da Justiça Eleitoral sobre a distribuição de recursos. Não há uma regulamentação clara e não se evita a corrupção”.

Para finalizar, Artigas evidencia a internet, focando-se mais nas redes sociais, como o meio que pode potencializar candidaturas. “A internet passou a ser um veículo importante para as campanhas eleitorais. Quem souber usá-la, pode se dar bem. Apesar de algumas restrições ainda perceptíveis no que diz respeito ao uso do meio pelos partidos, nota-se que se trata de um veículo disseminador de ideias, pois os eleitores/militantes usam cada vez mais”.

O cientista político cita um exemplo prático da realidade atual do uso das redes sociais: o deputado federal Jair Bolsonaro (PSL-RJ), pré-candidato à Presidência da República. “Bolsonaro apresenta a melhor campanha nas redes sociais, atingindo, sobretudo, as faixas mais jovens. Ele consegue mobilizar uma campanha que nenhum outro partido consegue”, conclui Artigas.




Por Gabriel Botto, Alexandre Freire, Gustavo Medeiros e Lorena Alencar dos Santos