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Mulheres se especializam em mecânica e vencem preconceitos

Não é incomum ouvir casos em que mulheres são enganadas ou tenham sido cobrados de forma indevida ao buscar serviços de conserto envolvendo mecânica. Essa situação acometeu a secretária Joelma Ferreira, 37, que, mesmo dirigindo há mais de dez anos, ao notar um defeito no próprio automóvel e procurar o conserto, foi enganada.
Ela notou que o carro apresentava um vazamento de óleo, sabia que o problema era esse, mas não compreendia qual era a causa.
Foi quando um amigo lhe indicou uma oficina mecânica ‘de confiança’ para resolver o problema. No local, o mecânico responsável relatou outros problemas que o automóvel supostamente teria.
“Ele ficou me relatando o defeito do carro, disse que precisava que meu automóvel ficasse na oficina para olhar melhor, que precisava trocar bomba de combustível. Eram tantos defeitos que quase entrei em desespero, por fim ele me relatou o valor dos serviços. Na época, fui cobrada em R$ 800”, afirmou Joelma.
Diante da visível fraude, ela buscou outras opiniões e por meio de uma amiga conseguiu outro mecânico. A situação fez com que a secretária se interessasse pela área. “Sempre achei, mesmo sem ter certeza, que estava sendo enganada. Era uma coisa tão simples que custou 81% a menos do valor inicial. Depois dessa situação corri atrás de um curso de mecânica, mas não me matriculei por que não tinha nenhuma mulher na turma, fiquei constrangida. Mas vejo vídeos e tutoriais na internet sobre o assunto”, afirmou Joelma.
Mercado de trabalho desafiador
Se na direção as mulheres já enfrentam preconceitos, no mercado de trabalho os desafios são ainda maiores. ‘Arriscar’ em profissões até então consideradas masculinas se torna um desafio, tanto pelas pressões causadas pelo preconceito, quanto pelas convenções sociais que estranham a mulher ocupando esse espaço. 
Suelen Gomes, de 25 anos, é técnica em mecânica e trabalha há seis anos em uma multinacional. Ela ingressou na empresa como estagiária e logo no início enfrentou o primeiro desafio. “Busquei sempre me dedicar ao curso, para mostrar que além de ser mulher eu sou mecânica. Naquele ambiente eu oferecia o meu profissional antes de tudo. Fui destaque na minha turma e assim que consegui o estágio tive a surpresa de ser ‘remanejada’ para a área administrativa, por que eu era mulher”, disse. 
Atualmente ela supervisiona uma equipe composta por 12 mecânicos homens. Para isso, ela destaca que foi preciso se impor. “Tive que me impor enquanto mecânica, me destacar e mostrar que sou capaz de trabalhar no serviço da manutenção e não apenas na administração, mas os desafios continuam principalmente pela profissão ser considerada masculina”, revelou. 
A área segue sendo majoritariamente masculina, mas as mulheres ocupam cada vez mais esse espaço. É possível encontrar cursos ministrados e voltados para mulheres, bem como grupos em redes sociais que discutem o tema. Aprendendo sobre as engrenagens e enfrentando o preconceito, Suelen e Joelma são exemplos que buscaram desafiar o ‘lugar’ que havia sido imposto a elas.
Machismo causa preconceito
Professora e pesquisadora da área de gênero (Foto: arquivo pessoal/Glória Rabay)
A pesquisadora da área de Gênero e professora da Universidade Federal da Paraíba, Glória Rabay, destaca que essa situação advém do machismo, problema social que permeia todas as instâncias da sociedade atingindo, sobretudo, as mulheres.
“O machismo é uma prática estrutural. Ele está entranhado no tecido social de várias formas e em todos os contextos. Vamos encontrar isso na escola, na família, nas relações de trabalho e, obviamente, nas relações que acontecem no trânsito e sobre as máquinas. Esse padrão social também vai às ruas nas formas de preconceito contra as mulheres”, afirma a professora.
Segundo Rabay, as mulheres historicamente foram destinadas ao serviço domésticos, às atividades que demandam carinho e zelo, tarefas que não envolvessem o manuseio de máquinas. Por isso o ‘espanto’ quando elas ocupam outro espaço.
“Falo de máquinas como símbolo de tecnologia, os avanços tecnológicos foram destinados aos homens e por isso as mulheres demoraram tanto a adquirirem esse tipo de poder. Seja na direção, e principalmente na compreensão de domínio das máquinas as mulheres são excluídas, por isso mulheres mecânicas sofrem preconceitos por que não é da cultura patriarcal o entendimento da mulher no funcionamento da tecnologia”, destaca a professora.

Cynthia Silva – MaisPB