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Nutella é retirada de supermercados por risco de causar câncer

A indústria do óleo de palma, no valor aproximado de U$$ 44 bilhões, está sob pressão desde que autoridades europeias anunciaram que o composto aumentaria o risco do surgimento de câncer. Contudo, o setor ganhou um novo aliado: a empresa produtora de Nutella.

Enquanto outras companhias europeias boicotam o óleo de palma, a Ferrero, responsável pela Nutella, passou a defender publicamente o ingrediente.

O óleo de palma bruto também é conhecido como azeite de dendê.

A empresa lançou uma campanha de marketing garantindo a segurança do seu principal produto, responsável por quase um quinto das vendas da companhia.


O óleo é o ingrediente responsável pela cremosidade e tempo de prateleira da Nutella. Segundo a Ferrero, a substituição por outros componentes, como óleo de girassol, alteraria as características do creme.

“Fazer Nutella sem óleo de palma resultaria em um produto inferior, seria um retrocesso”, diz Vincenzo Tapella, representante da Ferrero.

A possível substituição do óleo de palma também teria implicações econômicas. Entre as opções de óleos vegetais, ele é o mais barato –US$ 800 a tonelada, comparado a US$ 845 do óleo de girassol e US$ 920 o de canola.

A Ferrero usa, aproximadamente, 185.000 toneladas de óleo de palma por ano. Isso significa que qualquer mudança custaria entre US$ 8 milhões e US$ 22 milhões anuais. A empresa se negou a comentar esses valores.

A EFSA (Autoridade de Segurança Alimentar Europeia) afirmou, em maio de 2016, que o óleo de palma, quando refinado em temperaturas superiores aos 200 ºC, gerava mais substâncias cancerígenas em comparação aos outros óleos vegetais.

Contudo, a EFSA disse que mais estudos eram necessários e, em nenhum momento, recomendou que o produto deixasse de ser consumido.

A OMS (Organização Mundial da Saúde) e o FDA (Food and Drug Administration, órgão federal americano que regulamenta alimentos e remédios) chegaram à mesma conclusão em relação ao maior risco de ocorrência de câncer. De toda forma, não houve recomendações para a interrupção do consumo.

O assunto ganhou destaque na Itália após a a maior rede de supermercados do país, Coop, passar a boicotar o óleo de palma em todos os seus produtos. A rede afirmou que a atitude é uma precaução.

A maior produtora de pães e massas da Itália, Barilla, também eliminou a substância dos seus produtos e passou a usar a expressão “Não contém óleo de palma” em suas embalagens.

A decisão das empresas veio após pressão de ativistas, incluindo a principal associação agrícola italiana, Coldiretti, e a revista online alimentos Il Fatto Alimentare, que convocou a indústria alimentícia a parar de usar o óleo.

A Ferrero diz que, em seu processo, a temperatura não chega aos 200 ºC e que utiliza baixa pressão para minimizar substâncias potencialmente cancerígenas. As altas temperaturas são usadas para remover a cor vermelha natural da planta e eliminar seu odor.

Segundo a Ferrero, isso torna o processo mais demorado e cerca de 20% mais caro. Contudo, a empresa diz que o procedimento possibilita que os níveis de substâncias potencialmente cancerígenas se tornem tão pequenos a ponto de não serem detectados por instrumentos científicos.

“O óleo de palma usado pela Ferrero é seguro porque é derivado de componentes frescos e processados a temperaturas controladas”, afirmou Tapella no comercial para TV. Também foram feitas propagandas de página inteira em jornais.

A EFSA não quis comentar sobre os possíveis perigos de refinar o óleo de palma em temperaturas mais baixas.

PRODUTO ITALIANO

A Ferrero não é a única empresa europeia a continuar utilizando o óleo de palma após o relatório da EFSA. Unilever e Nestlé continuam incluindo o produto em chocolates, petiscos e margarinas.

As duas empresas afirmam que monitoram a questão das substâncias cancerígenas e que trabalham com seus fornecedores para manter tais substâncias nos menores valores possíveis.

Contudo, a Ferrero é a única grande empresa europeia a se utilizar de manifestações públicas para defesa do óleo.

A empresa afirmou à Reuters que conduziu “centenas de milhares de testes” relacionados a substâncias cancerígenas, tanto no óleo de palma quanto nos produtos finalizados.

Em 12 meses, até o final de agosto de 2016, as vendas de Nutella tinham caído cerca de 3%. A Ferrero atribui parcialmente a queda aos rivais anunciando produtos que “Não contém óleo de palma”.

Para tentar tranquilizar os consumidores, a empresa lançou sua campanha publicitária em setembro. A Ferrero afirma que já consegue perceber os resultados do investimento.

As vendas de Nutella na Itália cresceram cerca de 4% nos últimos quatro meses de 2016, disse Alessandro D’Este, chefe de negócios da Ferrero no país.

Segundo a empresa, as vendas globais de Nutella não foram afetadas negativamente e, inclusive, crescem entre 5% e 6% anualmente. A família detentora da Ferrero, não citada publicamente, não liberou os valores de vendas europeias fora da Itália.

A Ferrero terminou o ano fiscal, em agosto, com receita total de € 10 bilhões (cerca de US$ 10,5 bilhões), dos quais por volta de € 2 bilhões são provenientes de vendas de Nutella.

AMBIENTE

O relatório da EFSA acompanha preocupações ambientais relacionadas à indústria do óleo de palma. Grupos de proteção ecológica acusam a indústria de contribuir para o desmatamento.

Diversas empresas que usam o ingrediente, entre elas a Ferrero, afirmam comprar o óleo de fontes certificadas pela Roundtable on Sustainable Palm Oil, organização que trabalha com produtores para reduzir os impactos negativos do cultivo no ambiente.

Tapella afirmou à Reuters que a Nutella é feita com óleo de palma desde sua criação, nos anos 1960. Ele também disse que a empresa só trabalha com plantações de palma com certificado de sustentabilidade.

A campanha da Ferrero também atraiu críticas políticas.

O Movimento 5 Stelle, partido político italiano, pediu à autoridade italiana de regulação de propagandas para bloquear a campanha publicitária da Ferrero e multar a empresa por fornecer informações erradas, relacionadas à saúde e ao ambiente, aos consumidores.

Um porta-voz da autoridade italiana responsável por propagandas afirmou que ainda não decidiu se irá rejeitar a requisição ou se tomará medidas contra a Ferrero. Ele afirmou que o processo pode demorar semanas.

A indústria do óleo de palma, dominada por produtores na Malásia e na Indonésia, acredita que a Ferrero executa uma ação importante, pois estaria falando com os consumidores sobre equívocos relacionados ao produto.

“É uma boa coisa a Ferrero deixar claro que o óleo de palma usado é seguro e sustentável”, disse Yusof Basiron, executivo do Conselho Malaio de Óleo de Palma.

Ele afirmou que os produtores malaios não sofreram nenhum tipo de impacto nas exportações para a Europa. A Associação de Óleo de Palma da Indonésia fez a mesma afirmação. 



Folha